sobre azuis nessa noite gélida de dois mil e dezesseis.

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(a primeira pessoa do singular se faz plural; quer se desintegrar e se fundir ao vasto mundo múltiplo. o sítio, o sítio viaja e vai ali se reinventar) >>

azuis, um projeto que iniciei em 2013, de início é sobre identidade, sobre existir para além das bordas de instituições e representatividades, existir além-números, para além de rastreamentos e coordenadas, normatizações.

a existência se fortalece ao passo que se ramifica, se fortalece pelas bordas. desenha começos e meios e singularidades não apreensíveis nas superfícies, cria novos mundos, e talvez aí, quando esbarra na necessidade de fazer lugar e abrigo, é que se reconhece: o que acolhe não está normatizado. não segue os padrões da norma, que cada vez mais delira em suas vigilâncias e amortizações, linhas retas e práticas de exclusão.

o que vem da mata cresce em rede, tem ligadura, raízes fortes, micorrizas. surpreende porque não é codificável plenamente nem quer dominar o que está em volta. é natureza e por isso complexa, e por isso múltipla, embate, disputa: selvagem e acolhedora ao mesmo tempo.

penso na necessidade de reconhecimento dessa nossa existência em rede, sistêmica, que busca reentender as melhores maneiras de agir, se integrar e retribuir tudo o que recebemos a esse meio tão devastado, que faz parte de nós, tudo o que ele nos dá. por isso sementes. por isso venho aqui.

[*não é no foicelivros, gente linda. aqui é só eco, espectro. vigoramos noutros campos, em muitos]

ativismo hacker e ética da permacultura

no dia 9 de maio deste ano tive o grande prazer de participar de um debate sobre ativismo hacker e ética da permacultura, ou hacktivismo e permacultura. éticas, noções e práticas de autonomia, vivências, educação e diferentes perspectivas sobre tecnologias, fazeres e política permearam o efusivo debate. agradeço profundamente ao instituto casa da cidade pela abertura do espaço, à maisa martorano pelas trocas e sobretudo à nadia recioli pelo convite, pelas conversas e por tudo o que ainda vamos fazer.

debate continua na rede e ainda irá se espalhar e muito por outros espaços.

“sempre foi sobre união de mundos” 🙂

o pessoal da casa da joanna registrou o encontro, e que seja esporo para ramificações várias o/

ações para desaparecer: condivíduos, máscaras e personas fugidias

personagens forjadas, autores de quem não se sabe direito o paradeiro, pseudônimos, heterônimos, indivíduos coletivos, figuras ficcionais, imagens construídas. seriam maneiras que pessoas encontraram de camuflar suas “verdadeiras” identidades, ou simplesmente outros modos de agir? contra a política de nomes e números, que rastreia, mapeia e monitora indivíduos, propomos a criação de personas, anedotas, versões variantes de um paradeiro, imagens, estratégias, ações, respostas absurdas. importante é confundir.

~~ realizada em mesa circular de debates ruído experimento vozes subjetivas em meio à CRYTORAVE 2016 

programação completa //

sobre métodos

essa poesia de malas pesadas, de coisadura e já sabe que não espera e faz

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azuis ainda carrega uma relação com o mundo real, objetivo e nada discreto: o furtivo implementado, a obrigação do caráter, o assumir os caracteres próprios das coisas.

mostrar-se ou não deveria ser algo facultativo. cadastros em geral. fluxos e caminhos desviantes, um direito em si, embora a própria noção de direito esteja calcada em uma certa ordem das coisas.

uma problemática talvez é que o discurso de crítica se faz ainda dentro das coisas, se insere no sistema para a partir dele propor outros caminhos. sobretudo, utiliza os mesmos códigos binários para dizer que são binários, ou refaz paralelos caminhos errantes como forma de chamar a atenção para aquilo que se faz. a linguagem permanece dura, atenta, aberta a infusões.

tormenta o imperativo de comunicar, concatenar bem as palavras de forma inteligível. a pobreza da forma é de algum modo o risco, no asfalto, no sincero cinzeiro tão cotidiano de coisas faz, e vai podando os sossegos, tentando furtivamente errar, tecer outros meios, fincar o pano em algo que vá além.

fustigar os sistemas, furtar o meio e o fim do veículo inerte, em todas as dimensões.

se o processo se inicia em um rio, rio acima irá, contracorrente. para adentrar as matas é preciso primeiro se perder. os modos de percorrer qualquer coisa são imensos, de muitos mundos e variáveis. eu nem matematizo, eu vivo. matemática é da ordem de uma objetividade que não me contempla. ao contrário: ajuda as mesmas coisas sãs como sãos são os dias corridos, as ordenações de trampo, o calendário.

a floresta está dentro, o curioso lá está. procura, desorienta, adquire métodos para o corpo externo sedimentar. não são mais que carcaças a conhecer o intelecto, roupa que veste algo incerto, curva dos dias que se ramifica por entre as frestas.

floresta

primeiras impressões

o rg do seu primeiro filho, registro infame da noosfera. números de série, registros, pegadas, rastreamento. a indistinção. nas ruas, todos os dias.

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desenhos feitos em marca d’água, aquarela-água, azuis.

são dez dedos nas mãos, que deixam suas digitais sobre a folha de papel. cada folha é marcada por um dedo, em ordem – como quando fazemos registro civil.

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x artista quer falar do comum, do ordinário, mas acaba vendendo a sua identidade. autor se sobrepõe à obra; autor com uma única obra; identidade produtora de imagens.

produção, linha de fábrica. série. coleção. mímica, miniatura, versões. desdobramentos. conclusões. percursos, trajeto, processo, nem sempre espaço. trajetória. sossego.

se eu assino atrás da minha impressão digital, produzo algo que se aproxima de um rg. justamente aquilo cuja necessidade pretendo questionar. (eu fiz isso.reparo)

do mercado vem essa lógica do desejo, do original que se sobrepõe à cópia, da autenticação. exclusividade(exclui), edição limitada(limita). especulação. commodity-art, bolsa de valores.

primeirasimpressoesS

na coletiva 2013, eav parque lage
setembro e outubro

avenida passos em duas situações

em locais públicos onde há grande circulação de pessoas em dias de semana, colocamos uma lona (de tecido) no chão sobre uma “lona” preta. tinta azul solúvel em água é colocada sobre uma bandeja com espuma, de modo que funcione de carimbo. transeuntes são convidados a molhar sutilmente a sola dos sapatos na tinta e caminhar pela tela, pela lona, pelo chão. em sucessivas ações, o azul surge em locais distintos, enquanto as lonas adquirem novas camadas.

1º local: largo da carioca, rio de janeiro, próximo à avenida passos (referente ao famigerado prefeito pereira passos, responsável por uma onda de remoções e “revitalização” na cidade no começo do século XX).

colaboração: matheus simões e tino ruggero

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2º local: rua são josé, rio de janeiro, próximo ao terminal de ônibus menezes cortes e à praça xv, ambos pontos que ligam a capital a outras cidades próximas.

colaboração: maya dikstein

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de início a ideia era pisar só no chão mesmo, com os sapatos sujos de tinta. daí você lembra das políticas de promoção da “ordem” e manutenção do cinza das cidades (soberano sobre as outras cores). prefiro evitar problemas com policiais ou guardas civis. então veio a ideia da tela, ou seja, apresenta-se um espaço para caminhar. o chão acaba fazendo parte da ação, ele está lá, preto e branco, nunca exatamente limpo, em espera. há poucos postulados definidos, a obra se faz a cada vez.

03.07.2013

hoje pintamos a carioca de azul. depois, fui me lavar no banheiro do edifício av. central e a lata de tinta desapareceu. talvez seja até bom, assim eu fujo do azul indigo, ops, “azul tim” – se fosse laranja seria itaú. estão privatizando as cores, cara. daí eu falei que ia variar o tom e.. 50 tons de azul. não existe fora!

em todo caso, eu e matheus registramos imagens bonitas e ficamos de fazer uma outra vez. vou variar o lugar – apesar de que ali é algo. não fizemos na av. passos em si porque não há lugar. muito carro para pouca calçada, uma contradição.

decidimos percorrer o largo da carioca à procura de um canto propício, eram umas três e tanto da tarde. fiquei na dúvida se montava o lance entre o mágico e o vendedor de ouro, seria digno. atravessamos a rua, passamos pelo dançarino de patins bombante, jacaré dos patins é o nome, e pelo pregador crente, disseminador de tristeza, cuja placa diz: “você vai para o inferno”. nos afastamos um pouco, pareceu sensato, e nos instalamos ao lado de uma banca de jornal, num espaço que pedia para ser preenchido.

a ação durou pouco mais de uma hora, eu e os meninos nos alternando entre quem fazia o papel de animador de público e quem filmava. conclusão foi desejar ter feito um curso de palhaço, desinibição para artes de rua, algo assim. ou chamar alguém que tenha a manha. outra é que quando junta gente tende a juntar mais. e da roda que se forma, sempre alguém acaba topando participar. se esvazia, é outro trampo pra juntar gente de novo..

27.11.2013

chegamos na praça xv por volta de meio-dia, um pouco mais, era um dos lugares em que havia pensado. calha que ali tem espaço demais para pouca gente, não ia funcionar. maya me fala de um café no edifício menezes cortes (anexo ao terminal de ônibus) que é incrível, colaborativo e transparente, no segundo piso. um café que expõe os custos e gastos de sua manutenção em um quadro na parede. você paga o preço de custo mais o que pode/quer. estava lotado. óbvio.

por ali há muitos camelôs e muita gente: exatamente do que precisávamos. dessa vez, as pessoas espontaneamente vieram se aproximar e muito mais gente participou. riu-se muito, ouvi versos magníficos proferidos pelo vendedor de chaveiros (de tênis!) que estava ao nosso lado, fiquei de voltar. conclusões é que a tinta só registrou pegadas de tênis, galochas e chinelos. saltos altos e sapatos de verniz passam longe. mesmo assim, as participações se diversificavam. maya comentou sobre a estranheza de se apontar uma câmera, do quanto isso intimida. é claro. registramos pouco e deixamos rolar.

a lona também apresenta um obstáculo: a tendência é que as pessoas não a atravessem sem perceber. o contrário da proposta inicial: queria mesmo que as pessoas pisassem na tinta sem notar, e saíssem depois pintando o chão ao caminhar. outro ponto fundamental foi que o tom de azul que usamos dessa vez acabou sendo muito parecido com o que já estava na tela, de modo que era difícil identificar a presença de uma pegada nova. é claro, pensei, ninguém quer ser massa. se perder na indistinção dos azuis. da próxima vez, um azul diferente, mais claro, para somar nas camadas e se fazer notar.

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