• emo sex

     

     

     

    quais capuzes usar numa noite de chuva?

    deletérios medos

    dúvidas capazes de

    salientar

    um desejo

    .

    o tesão se desloca

    pornografia não dá conta

    (quem tem tempo mais para atravessar

    um mar de imagens pífias

    até encontrar aquelas bonitas,

    dignas de imensidão?)

    hoje não

    .

    o erotismo das palavras

    que aparecem

    o erotismo

    dos filmes que não assisti

    dar-se ao prazer das imagens

    encontrando cantinhos

    que fazem arrepiar e sorrir

    ao mesmo tempo

    .

    nas últimas buscas

    digito: love

    digito: intimacy

    digito: laughing

    laughing sex,

    emo sex:

    meus favoritos

     

     

     

     

  • luz

    derreter as calotas polares das lembranças esgarçadas y toda força corrompida por memórias em acúmulo, calos e afagos demais. sim, pois afago de memória, afago sem fala, só silenciação.

    gago e rouco o silêncio das vozes, as palavras mordidas, comunicações vastas e interrompidas furtivamente em um passar dos carros. amassar latinhas.

    e então comunicação demais, difusos meios, ruídos sem voz. somente ruídos. somente voz. separados eles ganham fôlego, vão colhendo suas florezinhas de papel cultivadas sem qualquer ordem, às manhãs que variam de horário pois dormem (às vezes)

    as calotas polares ali se curvaram aos bem-afrescos-e-aventurados, renovados, também curvos, subiram ao púlpito celeste e de lá propagaram – não antes sem vômitos na fala, engasgos, borbulhos – e então, pé ante pé, desceram torrentes as ladeiras em capas de chuva anti-vulcão, como se seus corpos fossem removíveis e então trocassem por outros, ou se fosse possível ao invés cambiar de ganas, peles e de vontades tropeças – ao inventar uma capa à prova de.

    me pergunto se é possível reescrever as narrativas de um modo tão codificado que não seja possível corrompê-las, pois sempre que se pensar ter encontrado o número, a senha, ela se transformará e soltará uma risada bem enorme na tua cara e será toda fofinha, stroboscópica, intragável e inapreensível. sempre a memória

    lancinantes lavas de vulcão. gratuita, eu sou voz e não existo. eu sou fotografia, pois luz, pensando que todos os meios conhecidos se tornaram voz, propagando no ar así tantas firulas. penso se tudo o que é supérfluo me alimenta. supérfluas vozes. supérfluo torvelinho. supérfluos amores que me sustentam (em memória)

    corpo que se levanta em vão, cultiva quarto, cultiva casa. esquiva. cumpre beneditos compromissos e corre, decide correr, assim como decide parar ou incidir em pausas para mor de respiração

    (respira)

    ladeiras cálidas que um dia acolheram agora incidem em pergunta
    eu só cuido das madrugadas, digo,
    de novo e tantas vezes

    antes da artemarcial e daquilo que chamam cotidiano

  • ar

    o dia verso noite
    artimancada de invenções
    curvas, turvas
    as remoelas
    desacordar

    sair do espaço do sonho
    onde vivo uma vida inteira
    trazer o sonho pro caminho
    como se
    como se fosse
    [uma coisa simples, isso

    nunca haverá
    ou sempre há de haver
    uma possibilidade

    (e sempre me lembro
    quando disse:
    *possibilidades*
    e não veio)

    desaprender os castigos
    as artimanhas,
    as falcatruas
    e faltas, as
    dancinhas felizes e
    depois não ver
    a ver navios

    espaçamento gasto
    evocando uma memória inteira
    uma membrana tão antiga
    desgostosa
    pífia

    com manejos e rostos
    de histórias daquelas
    que não desejamos
    o mundo binário
    do desdesejo
    do não solfejo
    da soltura

    a recusa ao caminhar
    é uma fissura
    a desfazer
    redefinir

    —-

  • sonhei que você escrevia um artigo sobre incomunicabilidade
    e compartilhava um vídeo do processo comigo

  • asfalto dança, revolvido e celeste

     
     
     

    do que seremos capazes. quando estivermos em residência. quando estivermos juntos. quando soubermos desatar os laços e não nos deixar contaminar pelas ruas. pelo ruído que envolve.

    encruzilhadas de encontros e um tanto de terra descascada, casa — muitos moraram aqui. nós estamos. um curto período de tempo, esses dias: vejo transição. para mim transição, enfim transição, de polir arestas transição.

    transitoriedade. estamos. rio de janeiro se impõe transitório, quando cutuca suas terras abaixo, tantas camadas. seria não só o pó que entra pelas janelas ou o ruído alto de máquinas, às vezes acontece, como o samba. mas ele perdura. a serra elétrica é tão sabão quanto as suas meias, você não questiona elas. você não questiona a serra elétrica e se pensar nem os helicópteros (aviões sentimos muito por essas bandas), nem a furadeira você considera. quem escolheu esse ruído? haveria máquinas silenciosas?

    tenho preferido manivelas e pedais e reco-recos a qualquer custo para não ensurdecer qualquer vizinhança, seja da minha casa ou de quem for. e minha casa minha dívida, minha dúvida ou desejo ou de fato algo que não existe. não existem quase casas no sentido lar numa cidade como essa, em que se atravessa túneis subterrâneos e então todos viramos asfalto, aos poucos asfalto, que é para casar com toda a máfia das construtoras que nos assalta.

    tomados de assalto, abrupto, e no entanto leva anos. o balneário da tevê dos sonhos de tantos brasileiros e brasileiras, nesta ordem subalterna que tem tantas categorias pouco gentis e pouco dignas porque sim ordenaram, na terra onde se fez escravos, então refúgio de uns brancos europeus que então trouxeram armas e ainda matam nativos, hoje

    multidão, faremos e somos e construímos pontes entre as membranas que descolam e as camadas que vêm à superfície como fúria, furiosamente nos deixando atravessar por camadas que caem, pouco a pouco, todos os dias, furiosamente perfuradas por máquinas ruidosas que constroem túneis por onde passa todo tipo de concreto e rios que não são mais rios mas fétidos detritos disso que chamam saneamento básico, as pessoas.

    as pessoas se juntam, as pessoas colaboram. as pessoas pensam rua. as pessoas nunca serão uníssono, multidão não é sobre isso. aprendi muito sobre dissenso e distensão e uns saberes práticos de autonomia (urbana) durante ocupações de tempos e tempos, que de tempos em tempos ocorrem, e cruzamos com elas. são terreno de mistura e utopias postas à mesa, ações e abraços e conjuntas confusões e desfiladeiros de acasos fortuitos, dentre outros movimentos

    o que será todo esse concreto que nos envolve? serão os viadutos capazes de nos engolir? lembrarão os carros do que um dia foram, quando não havia motores? como era viver sem motores?

    r rrr rr. percorro ruínas com uma bicicleta.

    relações com esforço, pernas. como meias, sabão: relações com esforço, braços. me yoga pela manhã, para assentar os músculos e não torturá-los demais. gradativamente. alcanço

    subir montanhas era uma intenção perspicaz e há muito alimentada nisso que chamam rio — tantas matas — complexa de pôr em prática assim como desejada, talvez por excesso de desejo, talvez pela clássica fatalidade dos dias e das noites (e as divisões dos tempos e do trabalho, nosso empecilho mais clássico, assim como as noitadas)

    florestas de noite ainda existem, mas não as adentramos na cidade (sobrevivência; prioridades)

    voaria lá nos altos dos montes e pernas fortes, pernas dormentes, pernas crescentes assim como a lua que agora nos assiste lá do alto, construindo lares acasos outros muito mais afáveis que quaisquer uns feitos em concreto

    são de matéria fluida os sonhos mais compridos e bonitos e velozes de saborear (é possível viver de matéria, maleável e componente fértil de outras casas, outras vozes, construção elementar de inventos e mundos, sim casas, habitações e cotidianos)

    e cotidianos velozes, meu bem, sabemos, temos demais. mas se pensar outro tipo de velocidade, aquela dos sonhos, em que se está aqui e depois em outro lugar, assim seguido, assim sobreposto, tempo-colagem, curva

    quis trabalhar com técnicas velhas de fotografia porque sim nostálgica, e também mercado de pulgas, o melhor das cidades, cheio das memórias dos nossos avós que não foram nossos, mas participaram de um sobremundo que nos atravessa, que salta desses lugares quase esquecidos e vem cá na nossa frente dizer que ainda existem (e em vivas cores, vivas vivas e pueris)

    de viagens pro estrangeiro também se enche o mercado de pulgas, a praça xv, e assim muitos mickeys povoam um imaginário infantil colonizado, que só três décadas depois começa a se dar conta inteiramente do que terá afinal sido tudo aquilo, todos aqueles bichos que não existiam nessas terras, todos uns referenciais meio estranhos, coloridinhos, colonizadinhos, branquinhos e muito pouco críticos, afinal

    (e de crítica seremos muitos, mas também respirar, respirar, que não seja esse pó que nos atravessa mas também a importância tão gigante de ser permeável, de não se afetar e assim criar ossos mais resistentes que possam sobreviver a tanta matéria revolvida dos solos, todos os passados remotos mais amendrontadores que sobem com tanta fúria à superfície e dançam

    dançar, vamos

     
     
     
     
     

    inesnin; casacomum

  • ‘transformação do silêncio em linguagem e ação’

    amar sem ser em silêncio.

    preciso cutucar os silêncios antes que virem pedra, e nos afundem mais fundo. eu, aquilo que me compõe, e eu componho com o verbo. com a garganta. é fundo.

    releio meus escritos antigos e vejo como eu escrevia tanto. ao longo dos anos, venho me silenciando. a insurreição reflectiva – e extremamente melancólica – que eu construía à base de criação e deriva foi dando lugar, pouco a pouco, a um esmagamento de rotina quando tinha emprego, e a um desespero silenciador quando não tinha. pagar as contas. eu acho que é isso, é tudo do que consigo me lembrar

    a experiência recente de passar por um editor de livros ao, pela primeira vez, tentar publicar meus poemas, estendendo ao longo de um dolorido ano um processo excruciante de publicação – ou não sei se chamo o ano de excruciante e a edição do livro de dolorida, escolham – tem sido difícil, consideravelmente penosa e broxante quando visualizamos o suposto entusiasmo que rodeia uma primeira publicação. mas. tudo bem. algo aconteceu ali. preciso trazer os escritos a público, mesmo que poucos leiam e haja embates de pontuação.

    agora mesmo, quando enfim escrevo depois de tanto – e um pouco oscilar se não ia para o papel, num momento em que não sei se a bagunça nos meus hds-computadores é maior ou menor que a dos meus cadernos, me lembro que os arrumaria “em breve” – me sinto roubando tempo das coisas que preciso fazer, como escrever ao orientador (mais um que de tanto demoro quase me esquece), pensar nos trabalhos remunerados e no portfolio refeito. na busca de casa. novelas que se repetem, e progredimos aos poucos. sim, progredimos!!!

    amor ainda é, de verdade, uma das emoções que mais me ocupam e atravessam todo e qualquer fazer cotidiano. quando na forma de entusiasmo, troca, é um furor magnífico que de fato torna tudo mais tolerável e encantador. quando silencia, ou trava, ou encontra descaminhos, recusas, é uma dor contínua que se propaga em ondas, às vezes recorrendo aos recursos místicos que supostamente nos ajudam a antever o que se passa. e eles parecem falar comigo de verdade, mas sei que preferem uma dinâmica moderada, sem abusos. o anseio por respostas me torna compulsiva. quero cambiar esse gênero na fala e é me é difícil.

    eu me lembrei, aqui, e me pareceu importante no sentido de causa maior em acontecimentos y ideias vir registrar, ou melhor, refletir por escrito para que não esqueça: “a transformação do silêncio em linguagem e ação”, da audre lorde, não só me tirou do poço profundo que foi o final de 2018, e me lembra constantemente de me aprofundar na obra da poeta, como é um mantra, uma máxima a lembrar com frequência, trazer para o mundo e para si de espírito e voluptuosidade. erotismo também é audre lorde. erotismo somos nós que vamos.

    eu vivi muitos amores em silêncio. praticamente toda uma vida. trinta e seis anos, me dei conta de que há 20 fiz sexo com a minha melhor amiga e assim teve início a minha vida sexual. conversando com uma pessoa transfeminina esses dias, das que toma hormônios, fala do quanto quer que seus peitinhos recém-nascidos sejam tocados, e eu me recordo de que entre os 12 e os dezessete anos, os meus não o teriam sido também. opa: a antes melhor amiga os tocou, eu lembro. devia ter uns 13. ou 16 ou por certo algo no meio disso. lembro quando escrevo aqui: reescrever toda a minha história, ainda e mais uma vez,
    sem que omita o que cai fora do padrão heterossexual? e ainda, com clareza, reescrever a minha história para que o episódio tão recorrente do amor não declarado não se repita?

    já levei susto e depois dissabor ao ouvir de alguém com quem eu não tinha tido nada, nem dado um beijo, de dizer que gostava de mim, ou me amava ou algo do tipo. amor não vivido, que o diz a título de propriedade, não me interessa. será isso? acho que ao dizer à pessoa que amo que eu a amo, eu só quero dizer “olha, podemos ser abertos com sentimentos (?), será que rola caminhar junto, tentar ver no que pode dar esse encontro?”

    eu já disse isso de inumeráveis formas contornando a palavra e os desejos, cortando frases pela metade, dizendo “escrevi um poema” e nunca enviando (tanto), porque se expor sem que seja mútuo não é desejável. estar vulnerável só vale se for compartilhado. não interessa estar nu diante daquele que se arma. ponto. é isso.

    e todo mundo vive armado há muito, o tempo todo e até os dentes, escapando e dissimulando, e isso bem antes do governo totalitário que zomba da nossa vida, hoje. vulnerabilidade é a moeda que não quer se difundir. feminina, será? mas e se nem pessoas não-binárias ou transfemininas podem lidar com ela, quem irá? sem fantasiar sobre a vulnerabilidade, sem se atirar a um poço sem medo (já o fiz, provável). não falo de masoquismo, falo de confiança mútua quando algo de bonito e surpreendente acontece entre duas pessoas. medo, terror? carinho, amor?

  • à bicha amada
    os louros as vozes cotovelos
    asneiras cabíveis lastros forças motrizes
    lentidão

    à bicha amada
    um corpo dourado à espreita
    (não era isso)
    um rosto abrigo beijinho

    chamego
    é o nome que se dá para cuddling
    na língua dos nossos parentes de terra
    de chão inventivo que só faz
    às gazes algozes cantinhos feridas
    assim

    de bairros distantes estrada aqui
    bem perto aqui
    ontem quem diz mês passado
    agora, ver

    um rodopio sagaz
    uma manobra contundente
    uma reviravolta
    um sopro esguio ventania brisa

    teu nome
    chiados encontros gêneros quem?
    pilhas de soterradas criaturas
    que procuram
    uma por vez

    livros infantis fivelas firulas
    abraços
    sobretudo abraços
    de invernos inventados halloween
    à distância

    música
    é um assobio estrondoso

    calma

    te beijo

  • ras go na parede / ras par o chão

    há o viver espalhado nos cantos.

    composto de ataduras e nozes, que se emaranham em galhos, pois dedos; abraços.

    compor o que se expôs de vez. não tem mais volta. artemanhas, manhaduras, sobremanhãs sem hora e sem sossego, semdormir: aqui chove, enfim.

    antebraços, solfejos, cachoeiradura, caminho de horta. cidade gigante, sem vez. ano de finais brutos, de sobredomínios, de sobrevivências. de ambivalências vorazes demais sem rir. sem tempo para demoras. sem ávida lucidez. unsamigos.

    sem brutaforça e brutaflor feliz. sem sonhos. sem costumária luz que sustenta, respiros. no lugar disso, um abajour quebrado. cobranças.

    a festa foi linda!, foi, aqui se paga. é o comum enviesado. aqui se inventa modos. aqui se fabrica lucidez comprada em uma gourmet shop empacotada em papel reciclado. aqui se cobra caro.

    as flores, atrasam. as brigas chegam. cabem inglórias, por entre as frestas das plantas já sofridas, quase mortas. haverão de sobreviver. talvez tenham que pegar a estrada dali. comer poeira um tanto.

    as cores resvalam. parecem empobrecer.

    o ponto brota em porosidade infértil. agruras. refaz uns caminhos e traz de volta as mais tretas lembranças. soslaio.

    carece de literatura. para tecer pontos sem ar; aqui chove, agora.

    .
    .

    o solo começa a gerar, úmido.

  • sobre pronomes

    se sou como me vejo

    e o mundo me vê
    rapidamente,
    classificando por padrões

    – aquele, ou aquela
    – (?)
    (gosto tanto mais da confusão)

    a/o

    e – vi o dia em que, sim, alguém
    (no que parece) me vê
    !

    família não
    professores, não muito
    invisíveis pronomes
    coloquei, eu falo, tá lá

    do nome
    ou pelo nome
    apesar do nome
    com o nome
    com meu nome
    (que me deram)
    eu sou?