fazer banho de assento
gozar na água do banho
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nino
nino pesa não sei quantos quilos, mas é preto com um brilho azul, mais alto e mais magro que seu antecessor. possui uma pequena curvatura na tampa, mas isso é mais charme que imperfeição. e se adapta lindamente aos seus olhos grandes.
nino gosta de jogar, e é um pouco esquizofrênico: chegou a apagar uma identidade inteira, e agora a confunde com a principal! mas não tem problema, ele prefere os softwares livres e não tem medo de trabalho. gosta de ver figuras e de ler também, mas às vezes imprime pra não cansar a vista.
ele por enquanto se veste de azul bem aos moldes tradicionais, mas eu sei que de careta não tem nada: me pede de vez em quando as mais diversas peraltices! oh sim, o mais importante, nino, mesmo sendo tão novo, é extremamente multimídia: gosta de imagens e sons, parece com a mãe. veio ao mundo sem pai, que isso é coisa obsoleta. independência, menino, é assim que se faz!
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diversas formas de respirar
o nó da saliva no canto
da boca o gosto do resto
na bexiga o canto
ouvido aos pés e
encanto
brisasabe o que eu queria
mesmo era comer vocêvocê sabe, saberia, sempre
poderia sabermas sempre
acaso sempre
esgote o bocado
o entusiasmo mesmo
que tanto toca
a ferida o quero
bem eu fiz por saber
onde estáferido canto abrigo
quem saberia
você -
que tenha corpo –
e saiba se abrir
sem medos de feridas.há tanto! no meio
emaranhado
virsua linda. buh!
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re-floresta #1: apartamento
recuperar as folhinhas. sacrificar o pranto, veneno, que turvou tantas tardes esses tempos. o manjericão morreu aqui em casa. signo de abandono, de sol, de infestação de bichos. muitos incompreensíveis, mas dentre eles há abelhas, só hoje foram quatro a visitar a cozinha. e olha que recém-limpa. fascinaram-se pelo mel. há muito compreendi que mel é de fato um roubo de abelhas, o seu mel, o seu leite das crianças. mas ainda acho curioso que me apareçam tantas abelhas em um apartamento, de sopetão, na cozinha.
zumbiram no meu ouvido, eu lavava louça. a abelha me rodeou, observou em volta no seu desefreado voo, incompreensível. alegria da abelha quando puxei uma fatia de melancia da geladeira, parti, deixei na pia. um pedaço meu, um dela. mamou alegríssima. e logo voltou para o mel, acompanhada das amigas.
amanhã se fará uma meditação em prol dos bichos pequeninos que habitam uma horta próxima, urbana. alegria horta, tristeza horta, amores horta, comunidade. força da comunidade e dos bichos pequeninos. libélulas, joaninhas, grilos e muitos outros que sim, se afetam com o veneno espalhado pelo ar que busca combater os mosquitos. onde há diversidade há vida. se acontece uma disfunção ou doença – a doença do mosquito – é porque há desequilíbrio. sempre entendo que a natureza está querendo nos dizer alguma coisa, com essas disfunções.
disfunção aqui em casa. mas de novo também um olhar, e esse viés incompreensível, que direciono a lacraias, traças, cupins: pragas urbanas. deslocadas totalmente de sua função, infestantes, sem predadores. na abstração do apartamento. cidade como abstração completa, mas disfuncional, distante de fundamento.
a questão de estar em lugares não se resolve, acompanha: tudo um ponto no meio do fluxo. aqui encontrei casa, aqui construí lugar. aqui teço relações em volta, ainda que muitas das atividades, em concentro e imaginação, estão verdadeiramente dentro. dentro de um espaço qualquer e muito próprio que não é esse das ruas, sequer do apartamento. não tem a ver com esse ventilador que me torna possível – via corrente elétrica – uma tarde de sol encapsulada nesse empilhamento, na solar, desértica e vasta são paulo.
conhecer a vastidão do solo: ainda há muito a explorar. muito me diz que está nas margens uma resiliência que não se vê nos acentramentos, uma alegria de que pouco se fala. um lugar assimétrico, forte, longe dos postais.
a incompreender postais que se compõem de vale do anhangabaú, teatro municipal, ruas, viadutos, pontes. je m’en fous para as grandes construções. há muita vida em volta, mas ela não encontra alimento. se espalha em ruídos e fluidos que não escoam.
os postais da cidade de onde vim tampouco me comunicam. acabam por ser construções, que paisagens. formam paisagens anedotas completamentes construídas, idealizadas, extraordinariamente caras, com legendas múltiplas para quem vem de fora. de novo um lugar é muitos, uma cidade. rio pra mim cidade turva que só, de caos e afetos, mal resolvidos, presos em engarrafamento.
um acolhimento em torno de si, do benfazejo sustento, é necessário para validar uma inscrição – construção do teto que se faz em subjetivo e muito concreto. casa, abstração, escritura e fluxo de tempo.
faz tanto tempo que não vejo o sol, de dentro.
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de tanto rugir, alcanço uma beleza que gosto
de tanto medir, me rasgo
de tanto começar, reinvento, resgato um alentode tanto fugir, chego a um consenso
frente a frente com o rasgo
compreendo a dor
tudo o que confere caminho
é válido -
parede
sem lugar para o gosto
verbo, sem lugar para a dança
(lugar)a-lugar eu faço, a esta hora
não antes, depois não saberei
o que seria dos rejuntes sem estes cantos(e tantos anos sem ao menos uma linha escrita, aberta)
fechadas casas são as tuas, apesar de entrar
conheço tantos meninos com medos
de serem entrada, passeio, aberturanão era a tua, mas hoje
sempre reparo quando falas dos beijos dos outros
os beijos dos outros não existem seus
não lá(como se negasse uma possibilidade, exame)
ação que em si mesma é só uma memória enviesada
recente, confusa,
clara em linhas retas de parede perfurada
sem chão -
rito
chuva em imperatriz, nevoeiro em bagé
não estamos
não estamos láa cidade se soprepõe tanto
ao longo dos anos, das fases e das horas do dia
que estou sempre levantando escombrosescombros doem as costas caem
escapo, não sem alvoroço
estratégia é também ruído, ainda queestou doente de ar
falta de atribuições fluidas
atribulações voluntáriascarinho que dá meia volta na rua
desaquece, procura
vastidão de medos e o quefaço a esta hora de novo em cima
do chão, em cima das pedras, sobre
o móvel da cama, quebradoque hospedou as vozes e depois limpar
os corpos moventes os rastros
e encontros que desatinamse rompem às metades, não comparecem
desembaraçam fios e estão sempre
a se embebedaro rasgo das ruas, não compareço
e quando vou reluto, incansável
para que não sejam arrastados os péso coração, se ele existe
e não descamba a pingar
tanto, que tanto engole e se volta para dentrolutas ferozes para não se fechar
não aquele luto de novo
insuportáveis meses tão recentesdos quais ainda bordo costuras
e poucos sabem como
as negociaçõesas contas de abaixo de zero abandono
por falta de melhor jeito momentâneo
me julgam, vejo fugasmedos alheios enquanto estaríamos juntos
coletividades dissolutas diante dos piores danos
medos, intermitentes trampos, cooperações falidasfôlego, e vida
descampo
desmemória vezdançar furiosamente e como se
a ordem dos processos fosse feita de que
forma, canto, ordenaçãouma por vez
os caminhos
não é uma abertura é um rompimentoque ensaio, engatinho
hesito até não poder mais
os modos os meios os dificílimos estragosas construções
os prazos embalsamados em pequenos lances
medo, daquilo que poderia, seestivesse à altura dos próprios desejos
isso, talvez, um tanto -
de mão / corpo / água
pensar meu nome escrito em
ar condicionado
terno emplumado, enxuto, asseado
sapatos de verniz ou botas
paetês
(a um pertencimento)azul
verde
prateadomata úmida
bem chegadaés tu mais uma vez
sem porquê
de corpo devaneado
mal inventadoa saber se
encontra
patrocínio
age à mentira relatada(sem café)
(com água)pero sem aquela
poça
alagada
dos dias
chorados
a conta vencida
ansiedadeconcreto é ver
alguns absurdos
darem certoem brilho vermelho
lá forauns amigos reunidos
em volta
em torno
de
fogueira
constelação
aquilo que agesem aqueles mesmos
vícios
donde se ouve
ecos
sinos
conjunçãoa roupa é a roupa é
a roupa mesmaquis estudar
teatro
mímica
butô
cortes rasgados
cenografia
cosmologia
lugares longíquos
montanhas
seres viventessim
sempre muito vivas
e imponentesa lembrar aos sóis
que habitam em nós
que tamanho temos
que somos maioria
que somos magníficas
que não existe caminhar só
nem casa grande demaisos buracos
hão de ser preenchidos
ou habitam
novas memóriasnão se deixam trancar nunca mais
não se deixam tolhir nunca maiscompletam
se cumprem
permanecem abertossomos maioria
somos (subjetivamente) imunesestamos vivas
como as árvores
e as montanhasque se engendram umas nas outras
e criam raízes subterrâneas
nunca rasgam
nunca hão de cair
são selvas
indomesticáveis
