• miolo

    costurava vozes e engasgava ruídos em sonho e em situação. sim, sonhei em situação, que se estendia até transformar algo potente em intensidade demais, ruído demais, então acorda. corpo dolorido, vai se reconhecendo nas dores, resgatando cada processo que enfim desembocou em – massagem. curvas que doem e fazem barulho, e assim cura, processo de cura, retorno às espirais que tanto me cultivam e me fazem estar em prumo. não tem persistência na aula porque mensalidade, mas o corpo vai aos poucos ganhando memória.

    da última vez que caí de bicicleta fez uma surpresa meu corpo – ele já sabe girar e se esquivar ao máximo da queda, aproveitando o impulso pra subir. rolamento, das aulas de contato-improvisação e kinomichi. ecos de aikido, que ainda não conheci em estado puro.

    obviamente me questiono sobre as divisões do tempo que faço e as relações que estabeleço. sonho que estejam próximas de algum zelo que não faça demorar demais. ninguém deseja que. ainda que o reconhecimento de que alguns processos demandam uma duração mais contínua, outros mais desenfreada, e por fim os processos lentos, lentos e fundamentalmente importantes na composição da narrativa.

    costuro. começo a costurar. da manutenção básica de tempos em tempos, necessária para o bom funcionamento das máquinas, óleos – eu só queria um cotidiano silêncio carinho gato afago comida quentinha e correr, pra sentir os músculos um pouco. sem fumaça de carros. qualquer lugar.

    só existem específicos e apontados com muito afinco, nada mais.

    memorar todos os dias.

    o sonho em matéria de chão era bem aberto, talvez excepcional, ou algo de excepcional ocorria. união entre lugares, referências, pessoas de esferas austrais e música. em tudo de excepcional haverá música (ou silêncio)

    braços abertos \o/

    mentiras vocês contam toda vida, e então acreditam nelas. um buraco asfáltico assim se cura? pontaria. tentam muitos, assistimos, criamos mídias bocados para silenciar e para vociferar, todas medidas. tornam mentiras também, as mídias. sobrepõem em camadas.

    o corte, o corte é a medida. meio de existir em camadas mas saber acessar – onde estará – a curva

  • fluxo

    onde está uma ventania que se situa exatamente no instante em que a dança começa, uma membrana é posta de lado; cartilagens de baleia formam costelas duras e maleáveis – uma fortaleza que tem meios e barbatanas; pés que correm por entre teias costuradas e que sim! cessam, se fazem percurso no chão; olhos que entre uma atenção e outra formam tecidos inversos, só se sabem em ação; imagens turvas que se formam cada vez mais em campo de letra, sobrepostas, miudinhas e contadas aos baldes para crianças; enxurrada, eu não sei, às vezes durmo; se considero cachoeiras como um aprendizado tão importante quanto bibliotecas; sob esse vínculo, a permacultura se realiza quando os pés se põem a caminhar; a casa então se move e deve aprender a existir desse modo.

  • brincadeira de criança, para além-horizonte

    experimento em narrativas midiáticas, dois mil e seis, niterói

    um risco no vazio, será possível? o fósforo acendeu, no meio do nada, não fui eu quem quis assim. simplesmente aconteceu.

    e agora todas as nossas vidas passadas, enroladas em banho-maria, deveriam envolver-se também? exatamente como fomos todos sucumbidos pela força gasta nos dias de trabalho ininterrupto. meus tempos nunca são os mesmos que os teus, ou penso eu ser dotada da infelicidade de experimentar tudo ao contrário: primeiro o fim, as brigas e os tormentos.

    um beijo na tua testa, para pedir perdão e lembrar de carinho, também. e depois uma lambida nas costas, que nem só de afagos digitais nós vivemos, um dia quando acontecer.

    minhas ilhas sonhadas, sem arquitetura de shopping ou qualquer ordem, havia senso de competição nisso tudo, constava nos planos? o propósito de sempre se divertir mesmo se tudo desse errado ficou, mas só ele, sem querer alcançar alguma coisa, não dá conta.

    se você vai mudar de vida ou se eu vou tomar jeito e ir trabalhar, só saberemos com o passar dos bocados. até lá, quando me faltarem palavras é porque algo de bonito eu omiti por não me permitir os excessos…

    em um desses dias de ano novo eu devo ter feito um pedido, assim, de brincadeira (pois não sei se acredito em nenhuma dessas coisas), o de viver algo que não pudesse imaginar. porque penso que se já fui capaz de imaginar os mínimos detalhes de várias histórias, já proibi todas estas de existirem de verdade. minha imaginação nunca corresponde ao que verdadeiramente acontece, ou é a memória que não é capaz de dar conta de verificar. mas, conferindo qualquer uma das duas hipóteses, o que acontece de real sempre vai além. talvez seja esta a característica mais excitante de todas as histórias, caso não seja a minha imaginação por demais desprovida de criatividade.

    talvez eu tenha deixado as brincadeiras-de-videogame (as quais pra mim sempre foram equivalentes a brincar de imaginação) jogadas em algum canto empoeirado da minha infância, e por isso, todas as histórias criadas em papel palpável, mortas.

    se acreditasse nas minhas próprias, as reais e as imaginárias, possivelmente poderia também acreditar que um dia nossos avós morrem, e não só os avós, que uma amiga vira aeromoça e o outro vai morar na islândia. que nem só de sonhos são feitos os dias, mas que eles existem de fato essencialmente para esboçar o futuro. se não cometem a proeza de acertar nos detalhes, podem ser ainda e sempre ricos em firulas, cartões postais enviados dos lugares mais distantes e das situações mais dignas de desenhos animados.

    eu, no meio de uma praia deserta, gritando “adeus!” a um navio que parte. eu, correndo numa praia deserta, dormindo numa praia deserta, bebendo água de coco o dia todo. eu, surfista… quanto tempo preciso para lembrar que quero ir à praia? ficaram presos nos desenhos animados? (os sonhos? as praias desertas?)

    eu, piloto de avião, desenhando num céu azul, caracóis. eu, subindo os alpes suíços, dando uma palestra a estrangeiros. eu, posando para uma capa de revista, dando entrevista sobre a minha banda de sucesso! nem só charlie brown pode possuir uma banda. aliás, charlie brown…

    muita lenha queimada nos dias da minha infância, uma quase infância-wannabe, depois destes tempos de vida em apartamentos e o fim dos sítios-refúgio. banho de rio sempre foi uma referência, mas competitividade não. me ensinaram a ser feliz, mas o caminho seria algo a descobrir sozinha.

    o cheiro de lenha me acompanha até hoje, está no lugar-home do conforto assim como o céu estrelado. depois, os telefonemas de voz sobre ip ninguém poderia ousar prever, talvez nem uma questão de achar extraordinária a situação, mas… nem só de distância vivo, ainda mais aquela construída.

    olhares oblíquos para além-horizonte! peixes nadando em voltas, fazendo espuma e sons bonitos na água. eu, sentada na areia, fitando a lua nascente.

  • coisa

    um contador de miniaturas. para poder antever tudo o que se dará, daqui pra frente, nunca atrás.

    contável porque coisadura, mercado, minérios, vastidão de mundos domesticada numa única pílula tátil, apartamento.

    adentrei o prédio, era possível; o possível que conseguia visualizar diante de tantos desejos de nomadismo e floresta, de construção, viagens. não havia permanência em viagens, nem sustento, somente vontades: braço que não alcança as frutas nos galhos superiores.

    necessária suspensão das correntes, ainda que (tanto), furtivos invernos, forjados em verões que voltarão, um dia.

    construção. intento de construir uns grandes monumentos, começando por pouco, um espaço, um fluxo de chão. aulas, algo com que sei lidar, aprendo a lidar, lido – está na fala e nos gestos um pouco de imensidão, de conhecimento. aprendizagem é algo que só se faz em curso, assim como mostrar: tornar visíveis processos, saber responder perguntas, localizar as pesquisas e tornar embates as vontades críticas, os permeios do sistema, e uns tantos modos de construir misturas. voluvear.

  • casco

    lentidão,
    como é bonita
    a tua terra

    como tece o teu segredo
    entrementes
    toda vida

    como constrói
    um arbusto
    tão sereno
    que tudo percebe

    silencioso
    arbusto

    todavia
    carrancudo
    lento,

    ameno
    tão seguro de si
    tão tormenta

    terminaria todos os afetos
    encurralando aquilo mesmo que vi
    que vivi
    em um ato

    sereno,
    contudo

    um domingo
    no campo asfalto
    se nem montanha

    amor
    sobe
    atravessa
    todas as pontes

    desato

    desalinha
    os montes

  • fazer banho de assento
    gozar na água do banho

  • minúcias

    mistérios curados a pinça, com cuidados mil, despedaçados em lágrimas contra a parede em um balneário distante. gostaria de te beijar, gostaria de te contar estórias sobre pessoas felizes que deram certo, sobre brincadeiras: sonhos de adulto. ambas parecemos crianças, e a busca das coisas que se quer mas não se sabe ao certo.

    viver a vida com uma intensidade dosada, de criações para os futuros incertos e corações sortidos tirados em um pacote de balas. sai-se pela noite costurando buracos dos outros, bebendo até transbordar, não cai no chão porque mamãe ensinou bons modos. entre os mundos quietinhos de cautelas cuidadosas e de desejos previsíveis e as ruas sujas, imundas e cheias de incertezas. tem aquelas bonitezas que se acha pelos lugares improváveis, pelos óbvios corações próximos demais pra se acreditar.

    hoje eu acordei várias vezes; ontem eu acordei de uma só e parecia ter dormido por milênios. entretanto, a náusea e a sensação de perda permaneceram inalteradas.

    tenho relutado até em escrever, concentro-me em viver e só cuspi a história uma única vez, não foi bonito, foi coisa de gente chapada, bêbada e velha desesperançada com a vida. da outra vez tentei contar, mas falei mais de passados que de presentes.

    como parênteses: o português mudou em várias regras, e eu não me conformo em escrever ideia sem acento. parece que falta algo, e é quase como em inglês. ideas for life. slogan de campanha de uma coisa qualquer – porque no fim as campanhas são todas quaisquer.

    medos de ideias nocivas contra mim. contra ti nunca quis fazer absolutamente nada de ruim, tornou-se potente agressão quando você disse, quando eu mais-que-verbalizei, domestiquei uma coisa intensa. pois é, minha querida, o mundo é assim ou é a forma como eu o vejo. e uma das coisas que eu busco, bem, é um certo tipo de compreensão.

    a dor se contorce aqui dentro, mas tem tanta cara de personagem indecisa que eu me esfacelo em solidão. fecharia-me nela, caso não tivesse que fazer coisas como trabalhar, estudar e viver. a vida no fim das contas é sempre essa soma de migalhas que vou catando pelo caminho, talvez enquanto não lançar o corpo todo aos riscos e às balas.

    tive tanta vontade de fazer uma dessas coisas que chamam de decadente, de gente perdida, tais como morar na rua ou virar stripper de boate no centro. mas as ruas são sujas demais e cheiram a derrota, e as noites têm gente feia e tosca em demasia. procurando coisas que não se pode nem pronunuciar, talvez caso as pessoas fossem todas belas e cheirosas (como em shortbus).

    meus medos viram estórias, os resultados de concursos estão como esperados, talvez aos vinte e quatro não se possa mais querer tantas coisas ao mesmo tempo. é hora de escolher entre a academia e as artes, negar a comunicação de vez ou tentar absorvê-la sem tantas adversidades. aversão eu tenho dos infelizes, mas é fato que tenho contado muitos passados e já começo a lamentar os futuros. porque as criações para a vida de crianças de 10 e 18 anos são diferentes daquelas dos quase adultos de vinte e quatro, mesmo com cara de 22, é uma criança que já precisa estar lá, em cima do palco, mostrando a que veio e mantendo a pose.

    minhas estórias por hora estão contorcidas, levemente enfermas e escondendo a pimenta por debaixo dos lençóis. caso de meninas bonitas, ideias para não sei quando: muitos desejos, como tem sido.

  • tudo aquilo que fomos,
    ainda somos,

  • você abraça os homens e eles não te abraçam de volta

    você abraça os homens e eles não te abraçam de volta
    fogo no mato, filosofia da rua
    fechamento é só para os parças
    os manés, os machos com o rabo entre as pernas
    tanta gente com quem poderia apenas trocar ideia
    parceria, companhia, trampo y confabulações
    pois viram as costas, sequer cogitam conversar
    se não te veem se curvar
    soletrar seus nomes em desejo
    se te veem apenas como gente sem maldade

    matilha de um gênero só
    aquele que não nomeiam
    dominando chalés, governos, convenções
    nada de novo, mas chega
    que pequenos, vocês
    ingnóbeis anciãos
    desesperados por atenção