a insistência no exílio como matéria infértil
(não se exila no concreto; somente nas montanhas ou à beira do mar)
porosidade
a insistência no exílio como matéria infértil
(não se exila no concreto; somente nas montanhas ou à beira do mar)
porosidade
posição fetal agitando
um punho um aceno um abraço
garante que
ao menos a gente tenha junto
alguma voz
um novelo
e seu bagaço
encontro da família
com o asfalto,
a rua dura
as legendas dessa cama
contam com duas ou três arestas
não doces, não tem vez
meu corpo
os mosquitos
o chão
o saliente zumbido
a tua voz
no celular, àquela altura
da manhã enviesada
no rasgo, no sustento
do que viria a ser
e do que nunca foi
e que provavelmente
encerraríamos aqui mesmo
o novelo o novelo absinto
reanimo
os bichos
rumo, ruminância
a pensar se precisa de tudo isso que inventaram para o seu sustento. tudo aquilo que chamam de vida, com suas vias pré-programadas – para quê? se não serve para as gentes que dirá para o que há em volta; serve ao controle. é tudo a serviço do controle, sabemos disso.
sabe-se aquilo que se releva, somente. o que importa para cada continente. e todos os lances que escapam, que ficam fora do alcance, para que servirão? é verdade que tudo precisa servir para alguma coisa, ter um propósito, uma prontidão?
uma coisa que importa é se dedicar a si mesmo, minimamente. cuidar e esquecer de si. saber falar de si: não haverá ninguém mais se não houver você ali primeiro, a adorar e habitar o que possui. corpo, trabalho, ambiente, amores próprios e plurais. são todavida deles mesmos, e não adianta evitar, serão nobres se souberem aprender o desprendimento.
não há via que se salve se não cuidar. lacrimejar é raro, ao menos por aqui, mas vale o que leva. vai embora, cuidado! para que tanta cautela, não vem dali. o mundo é um só, a vida é muitas mas anda anda e continua seguindo, não há o que fazer. o dia é um só. amor é um só, até, seja aquele que foi ou o que ficou. difícil ver à frente; não adianta se dedicar às artes da previsão que somente se aprende a tomar cuidado. a se jogar da cachoeira não, e é só o estágio mínimo para aprender o lance.
jogar o corpo, deixar cair, deixar boiar, criar raízes
(aprender com o tempo, respeitar o tempo, respirar)
tem vezes em que só existe medo tentando, é preciso conhecer o medo real calafrio na real das coisas, sem antecipar ou pestanejar diante dos acontecimentos. expectativas demais e coroas e rodeios – tão inúteis!
sobretudo organização, jogos de deixa e segura, calafrios
escrever o texto sobre o trabalho:
ruminar o trabalho;
se dedicar.
como é difícil estar só quando não se tem um espaço! (e como foram dificultosas as itinerâncias acidentais desses últimos meses, não saber onde estar, é preciso existir primeiro para ser visto pelo outro (e estar com o outro é só movimento, não é preciso se preocupar))
torturar o amor até deixar passar
organizar o corpo, os amores correntes
(contracorrente de rio – nadar! nadar! nadar!)
do silêncio que sumi
sumi e parti
e desabei e chorei
cacos e caos
terrível lembrança
do que fomos
do que vivi
e se há tanto
se recomeço
é dois mil e vinte e três
noventa e sete rasgos contados
estradas que desejo
e são meu corpo
imenso
povoado
se perde
quando retesado
parado
não fico não
contar uma anedota a cada noite, tal como fazem as redes que sugam nossos sentidos. uma ideia, um abracinho, murmúrio de ideia ainda se formando, e então busca, e então vício, acorda, abre, lê o que está ali no fluxo, e logo se anodina, cataploft, cadê, cabia, caberia. agora então só discursos inteligíveis, fáceis, diretos – jornalismo, política, informação. do real das vidas nos tornamos chatos, planos, vulneráveis, sem mito e sem história, qual tropeção sonâmbulo depois se formou.
um abraço em esquecimento por isso tudo que não se torna, que não chega a vingar, inclusive o abraço, inclusive o encontro, tudo o que está prestes a, e se forma outra coisa, outra formação de corrente, outro desvio na curva, outro acontecimento. não chega a ser e não chega a vir, ainda que em outro dia tanto entusiasmo, tanta crença de um dia chegar, e um dia ir, e os planos juntos, tanta bossa. depois tudo isso vira crença, anedota, invenção, corpo em riste, processo, até mentira.
abraços mentira e todo laço, toda bossa, todo solfejo e toda perdição, toda pedalada sem rumo, todo mistério que não quer sanar. e todos os exílios que se cria para si, e há um exílio em cada canto, cada mirada não fortuita, não acabada, cada mudança de cidade que pestaneja, que tem dúvida. que guarda em abraços uma vida inteira, que não sabe mudar, que troca de ramo e de ação assim em meses, porque deseja outra coisa, mas então ordenar, ordenar sem saber como, notícia, notícia, notícia.
sim, se aquela merda toda mesmo vingar, aquela conspiração da via impressa e muito real num estado muito distante daqui, vai ser ruim sim, e não importa se para mim ou para você, vai impactar.
se eu virar a notícia, se ela corpo em mim, se eu não souber anedota, escape, cachoeira, sonambulismo alegre e invenção: é morte, é viaduto, membrana morta, cidade suja, sem chão.
o chão é a memória tua toda enviesada, espiralada, construção feita a cada milímetro, sentida sem nenhuma medida, só umas ladeirinhas a subir sem nem notar.
é amor, é amor, é coisa informe, é abraço em si, percorrer um espaço, anotar.
anotação não é fácil de fazer quando a gente tem dúvida, e a gente tem, eu sempre tenho, eu violão, que me olha e eu escrevo, escrevo enquanto meu discurso é um violão. meu interlocutor, maior que todas as frestas.
nadando contracorrente, tranquila, de costas; o fogo aceso; os amigos presentes; a comida farta; o céu estrelado; os livros e projetos em prumo; as estórias; os jogos; as cores; as crianças; o tecido de pendurar; as danças, a rede, sambasadashiva; passado, presente, futuro; björk; os mapas; os tempos porvir; os vínculos alegres; o cultivo; a busca; o cuidado; o carinho; as estradas abertas; os rumos; as bagagens; as cartas; a mata; o rio, o rio, o rio
foto da Luiza Cilente no canto mágico da Luar, em boas-vindas ao 2020
nos confinaram num planeta incerto
gozar pelos caminhos
uma festa que não deu certo. um desejo contido. sufocado entre quatro paredes.
duas imagens:
(1) um quadro triangular, em 4:3, dentro dele uma escada velha de madeira, à esquerda. ao fundo, uma parede desgastada pelo tempo.
(2) menina vai ao banheiro e ouve uma senhora falar. sai da cabine e continua a ouvir, ela fala de estrelas e lugares perdidos. e completa dizendo que os jovens tendem a confundir fantasia e realidade, o que pode ser perigoso e a preocupa. finaliza com uma satisfação: admira o trabalho dos jovens, e é tudo graças à tecnologia. À TECNOLOGIA.
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o tempo me pede para escrever sobre o tempo que me consome e o tempo vasto que se perdeu nas memórias e que se sente na música que faz parar o tempo e bailar em voltas em saias que se confundem com meias que se confundem com beijos na boca. o tempo futuro é o que eu não sei mas os livros todos eles especulam, eles falam de crenças perdidas e espaçonaves, de andróides e mentes fora do corpo, os anos oitenta foram tanto. só suprimiria todos aqueles exageros banhados em laquê e centropeitos e mesmo alguns sintetizadores.
o tempo em que durmo é que é passado em bocados, horas não sentidas, sussuros, cafunés-em-mim-mesma. acordo de lentes – que é pra inaugurar estas novas – e logo percebo; o quanto em vão, quantas vontades, e atropelos.
resolução de fim de ano dá nisso, eu não ia fazer uma. eu precisava discorrer sobre o tempo e seria tão bom falar desse farfalhar das árvores daqui do bairro ainda que com o sol TÃO forte; do canto das cigarras não só ao entardecer mas várias vezes por dia. tem som de silêncio.
falar sobre a aceleração neste fim de ano que é tão acelerado; na pressa se perde o sentido, na pressa as coisas vão caindo pelo caminho. dezembro cheira a nada, eu insisto mas não consigo, só tem som de cigarras porque eu ignoro os carros agitados e as compras intensas. por toda a volta.
caio no mar. dou meia volta.
vox ~ partituras de verbos y danças / por inês nin
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brilho
clã
corro
respiro
ruído
sustento
vento
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