• cambridge analytica

    quem levanta os montes depois de mortos? quem ergue o eixo que faz respirar? quem derrama suas fezes sobre um povo, corrói seus novelos e ergue um punho

    sobre
    nós

    está ali às cegas
    tateando infinitos em praça pública
    mil sóis em utopias
    e amores

    esmagados,
    sem dó

    DIANTE DO ESCÂNDALO

    há os galhos
    que se embrenham uns
    aos outros
    e sobem
    encostas

    assuntos sinceros, recebidos em ouriço
    asperezas, recusas

    DIANTE DA ARMADILHA

    ergue o espírito em carne viva
    conta da história de seus avós
    seus pais, seus tios

    NÃO HÁ DE CALAR

    chorou
    no meio
    da praça

    caminhos ouvir carimbó

    no meio
    da praça

    DIANTE DO CAOS

    quisera mais vezes findar
    e recomeçar
    sem sentir perder os
    árbitros solfejos
    não encontra

    o nado alicerce que alhures ali almeja
    um navio
    um chão

    dança
    união

    em que país

    COMPÊNDIO DE IDEIAS E COISAÇÃO
    não rasgo

    hei
    de construir

    memória

  • nino

    nino pesa não sei quantos quilos, mas é preto com um brilho azul, mais alto e mais magro que seu antecessor. possui uma pequena curvatura na tampa, mas isso é mais charme que imperfeição. e se adapta lindamente aos seus olhos grandes.

    nino gosta de jogar, e é um pouco esquizofrênico: chegou a apagar uma identidade inteira, e agora a confunde com a principal! mas não tem problema, ele prefere os softwares livres e não tem medo de trabalho. gosta de ver figuras e de ler também, mas às vezes imprime pra não cansar a vista.

    ele por enquanto se veste de azul bem aos moldes tradicionais, mas eu sei que de careta não tem nada: me pede de vez em quando as mais diversas peraltices! oh sim, o mais importante, nino, mesmo sendo tão novo, é extremamente multimídia: gosta de imagens e sons, parece com a mãe. veio ao mundo sem pai, que isso é coisa obsoleta. independência, menino, é assim que se faz!

  • importa

    composições de sufrágios. não conheço coisa alguma.

    engole o vento e sonha: alguns acasos fortuitos, memoráveis eventos, e então acordo.

    penso em percevejo sem chamas, só observo, atento a qualquer movimentação e também qualquer acalento.

    (só sai no caderno)

    expedito traz sossego quando eleva, porque a floresta também é quente, imensa, também se perde. precisa do embrenhar-se no sistema (da natureza) para se sentir desafio, para se ver forte, perseverar e criar coisas que construam sentido.

    o que parcialmente dá sono, e que também desanima, às vezes turva, é que tem tantas gentes sem intelectos, que usam quaisquer cores para se comunicar, e eu acabo tendo preguiça delas, algo vago como “neste mundo já estive aí, ou pior, isso é coisa de cá”.

    bêbados inertes também sonham, sim acredito, assim como publicitários e porventuras. instituições. cheiram cocaína todas as manhãs e assim mantêm o ritmo, tal como o relógio.

    as manhãs que conheço não têm nome, mal têm hora, mas acontecem quase sempre do mesmo modo: estou tranquila, acordo. o sonho é tão interessante que é difícil me desvencilhar dele. preciso dançar, correr, pois é frustrante constatar que aqui é o mundo “real” e perceber que o sonho, ao puxar tempo para si, refreia e come meu tempo das coisas reais.

    aquele meu tempo que espera. que de tanto misturar os corpos em vão sabe que é muita informação acumular tantos odores e tatos em um só quarto, pele, corpo ou dimensão. sempre escolho bem menos que quatro. nem sempre percebem assim da outra ponta que comunica. só quando há encontro.

    funciono melhor em acasos que combinações.

    pero, porém: sinto saudades.

    e: relembro que minhas incompletudes não são minhas, são memória; ausência de um algo que falha em se construir e ao mesmo tempo se faz: como construir de ausências um ente, como sempre; e lembrar que há tanto aqui, expedito.

  • pegar com o dedo aquilo que desanima. é uma coisa, palpável, que oscila entre o estômago e o pescoço. beira a garganta, raramente sai a público. uma emoção convulsiva, evasiva, inerte: presta pra nada, essa torrência.

    desanimar o desânimo. chegamos nesse ponto. nunca estivemos em outro lugar.

  • de mão / corpo / água

    pensar meu nome escrito em
    ar condicionado
    terno emplumado, enxuto, asseado
    sapatos de verniz ou botas
    paetês
    (a um pertencimento)

    azul
    verde
    prateado

    mata úmida
    bem chegada

    és tu mais uma vez
    sem porquê
    de corpo devaneado
    mal inventado

    a saber se
              encontra
                  patrocínio
    age à mentira relatada

    (sem café)
    (com água)

    pero sem aquela
    poça
    alagada
    dos dias
    chorados
    a conta vencida
    ansiedade

    concreto é ver
    alguns absurdos
    darem certo

    em brilho vermelho
    lá fora

    uns amigos reunidos
    em volta
    em torno
    de
    fogueira
    constelação
    aquilo que age

    sem aqueles mesmos
    vícios
    donde se ouve
    ecos
    sinos
    conjunção

    a roupa é a roupa é
    a roupa mesma

    quis estudar
    teatro
    mímica
    butô
    cortes rasgados
    cenografia
    cosmologia
    lugares longíquos
    montanhas
    seres viventes

    sim
    sempre muito vivas
    e imponentes

    a lembrar aos sóis
    que habitam em nós
    que tamanho temos
    que somos maioria
    que somos magníficas
    que não existe caminhar só
    nem casa grande demais

    os buracos
    hão de ser preenchidos
    ou habitam
    novas memórias

    não se deixam trancar nunca mais
    não se deixam tolhir nunca mais

    completam
    se cumprem
    permanecem abertos

    somos maioria
    somos (subjetivamente) imunes

    estamos vivas
    como as árvores
    e as montanhas

    que se engendram umas nas outras
    e criam raízes subterrâneas
    nunca rasgam
    nunca hão de cair
    são selvas
    indomesticáveis

  • ramificação

    meu bem conhece fuligens. fuligens de árvores, de folhas e pingüins.

    tem pressa mais que coelho apressado, meio como jabuti. rodeia. rodeia sempre. confunde naturezas. é tão belo.

    será que nos vemos, assim tão velhos, novos em folha, tudo de novo?

    tudo eu não faria, mas faria nada novamente muitas vezes.

    meus erros, tuas histórias.

    falcatruas e teus erros também.

    tantas conversas de banheiro e camas. tantas chaves rodadas. tanta comoção!

    e se eu fosse de novo a todos aqueles lugares bonitos e perguntasse a eles o que pensam de nós?

    são os outros, não sou eu. inimigo.

    viagens sozinha. gosto tanto de dançar.

    assim: pode dançar comigo?

  • o que é que quebra e sai
    correndo
    queria viver por dentro das coisas
    sem ter que almejar
    torrentes nada
    justiça pelego
    divulgação supremacia
    emprego, asfalto
    divulgação
    essa coisa vã que consome
    todos os poemas
    todos os dias da vida

    já quis morrer
    inúmeras vezes
    porque todos os dias
    têm de ser pagos
    e o dinheiro torna a minha cara muda
    a necessidade
    embebe em substituições
    aquilo de que seriam feitos os dias
    instituições, vontades
    não andam juntas
    pois brigam dia-a-dia
    o estudo o apreço
    a escrita envelheço
    sem publicar livro
    não
    publico
    divulgo
    e emudeço
    de novo

  • mar

    a praia é um santuário que as pessoas vão visitar. aquilo que fazemos quando estamos lá, em companhia de pessoas, é apenas tratar como comum o acesso a algo extremamente poderoso, extraordinário. la mer, poderosa, o mar, iemanjá. a força, a energia das marés, da água viva em movimento que é o mar é sentida no corpo por horas depois de ir. e segue. relaxa os músculos, ajuda a respirar, a curar feridas, assimilar contratempos, amar. se amar. amar a si, antes. emanar calmaria, resistência. mesmo quem não mergulha sente, já que a maresia permeia o ambiente, está no ar, arredores. mas, sem dúvida que mergulhar é mais intenso, mais forte.

    cachoeira também é um santuário. a floresta como um todo. mas as águas, as águas. fonte da vida, mesmo! o que o mar limpa em profundidade com seu sal a cachoeira vem avivar. dar risadinhas com as cócegas fortaleza das águas. respirar ar novo, pura vida.

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    itacoá,

    um caminho afago
    no sol de vinte e seis de dezembro