• fazer banho de assento
    gozar na água do banho

  • escrever para ninguém

  • tudo aquilo que fomos,
    ainda somos,

  • ~

    minhas vestes de samurai já não ecoam hinos
    os ramos não existem mais

    astutos saberes de coisaduras
    ibagens

    é preciso reinventar as estruturas
    visagens, planas, espasmos correntes

    todos os meses foram postos à mesa
    assim como os iguais

    calados, publicam membranas
    assombram correntes, seguem coisas mortas

    ..

    do sentido que perdemos ontem
    temos aqui: uma amostra

    um não-sei-quem-faz
    percorridos foram os ventos

    têm sido todos os dias
    todos os dias me calo

    tagarelamos conjuntamente sobre quaisquer assuntos
    minha boca tem bolhas

    de sussurros me faço em paz
    solfejo, passarinha

    se abro os véus me põem mais bolhas
    inócuos vermes que saem

    nada de auspicioso nisso, sabemos
    contudo, minha boca

    astutos sossegos construídos e sem modos
    seremos,

    selar os cantos de coisentão
    e procurar morfemas

    livros
    uma boca inerte talvez que observa

    se expressa por uma vitrola
    mais frequentemente pela cozinha, mesmo

    barriga
    sabor e transformação de matéria, alimento

    (quase não escrevo)
    (quase não obliquo)

  • nos confinaram num planeta incerto

    gozar pelos caminhos

  • o que é que quebra e sai
    correndo
    queria viver por dentro das coisas
    sem ter que almejar
    torrentes nada
    justiça pelego
    divulgação supremacia
    emprego, asfalto
    divulgação
    essa coisa vã que consome
    todos os poemas
    todos os dias da vida

    já quis morrer
    inúmeras vezes
    porque todos os dias
    têm de ser pagos
    e o dinheiro torna a minha cara muda
    a necessidade
    embebe em substituições
    aquilo de que seriam feitos os dias
    instituições, vontades
    não andam juntas
    pois brigam dia-a-dia
    o estudo o apreço
    a escrita envelheço
    sem publicar livro
    não
    publico
    divulgo
    e emudeço
    de novo

  • brilho

    sobreposição de montes, desta vez novidade;

    aprender a mover os montes um por vez. os cascos.

    astutos montes concedem abraços.
    acolhi.

    acolhedores cantos de tanta lucidez,
    sem firulas,
    com respiros,
    sem bocados,
    entredentes.

    acolhedores montes de tantas mantas
    cem invernos
    toalhinha

    praia no inverno entrecantos
    – um ritual de chão,
    lá em casa.

    escopo de porventura
    sossego
    se entende o que vem e deixa o que vai.

    sem erro.

    compreensão do esforço e do zelo
    cada qual se encaixa
    aquece
    por merecimento

    o tamanho das palavras
    e todos os silêncios imagéticos
    mesmo os sem imagem:
    só silêncio
    às margens.

    vento que tem campo
    e canto
    aberto à construção de
    flores
    e à recepção de
    sementes

    construção
    invento.

  • a bailar (xilofones)

    caçadores de mentiras
    espalham-se como ratos, como pássaros
    ululantes em céus de verão
    e em invernos.

    o ano todo
    a expor suas criações inéditas
    fugidias e pretensamente
    despreocupadas.

    costuro idéias
    de cores celofanes, bem longe dali
    todos os dias
    todos os dias
    pra espantar as memórias
    inóspitas.

    lembrar de futuros distantes
    onde histórias
    são criadas para entreter furacões
    de infâncias perdidas
    gastas em preocupações
    tão corriqueiras.

    ideias de gênios passantes
    com cachorros a tiracolo
    animais pitorescos
    fantasiados de carnavais
    por vir!

    xilofones de montão
    pra entreter
    tanta gente.

    (!)

  • trans

    TRANS-

    conceber um SAIR do LUGAR implica sob certo sentido em uma superação. como ir além da experiência anterior; um ponto que impulsionado por MOVIMENTO gera uma outra situação.

    transcender um momento disforme, pouco funcional, mambembe. desfazer uma certa dormência, reentender todos os processos. misturar a disposição dos intelectos.

    uma bússola revirada, e revigorada.

    em viagens recentes fiz questão de carregar uma bússola, companheira tão amiga quanto a lanterna e uma mochila gordinha, um pouco alta. apetrechos úteis, talvez neste caso ainda mais úteis enquanto ideias de viagem, desejos de nomadismo. vontades de incorporar um personagem explorador: expedito azuis, aquele que age, despachado viajante. procura caronas, aprende a voar. povoa de cores e florestas uma paisagem, ela mesma enquanto imagem de sossego e desafios, abrigo, localizada mais DENTRO do que FORA, para falar de coordenadas. desejos, como as praças e os lugares, se confundem. nada é só um mesmo, coisa afável e distinguível das demais.

    ir além implica em transitar. na contramão dos engarrafamentos*, caminho sem pressa, atravesso pontes e escalo prédios. se trata de superar expectativas, por adquirir rumos truncados, incertos demais para especular. nada mais que um treino, até que saiba não existir em espera nem planejamentos complexos, mas sim em processo, corrente, que flui e escorre das calçadas, só anda a pé.

    de uma precisão de rejuntes: extrair a simplicidade das coisas. descomplexificar, como um processo químico. para tal, é necessário desprogramar, repensar todos os sistemas e métodos vigentes. desordenar. haverá necessidades de; e se fizer de outro modo; se é verdade que preciso tanto; o solo mesmo não se refaz? composição. assimilar as cores do local, a partir dele construir e só. em volta, são tantas as coisas que estimulam a perda sem rumo, o caminho mesmo do cristal, do arranha-céu com tv de plasma e correrias.

    transição. transitivo transitar dos entes mistérios, minérios, ritmos próprios constituintes da tábula rasa da monotonia. monotipia, rumos em vão: tantas técnicas e só vejo uma cor. ruído de voltagens, confunde nossos cérebros.

    x

    trans é um radical queer. que se situa para além dos sistemas, da compreensão costumeira dos entrecoisas. costura bordados e ri do próprio desatino, desconversa, nunca se saberá ao certo onde vai. pode assumir caracteres absurdos, atravessar a amazônia, se transformar.

    transtornos são possíveis, aspectos sinceros que vêm à flor da pele, se perdem. água e animais, super gêmeos ativar, sempre outra coisa que não a esperada. x, que não tem gênero nem classe, assume formas variadas de acordo com a situação. estratégia faz parte de sua estrutura desestruturante – preparada para transcender as maiores crises, entrar em transe, alucinar.

    *processos lúdicos que implicam em engarrafar carros e pessoas, como consequência de um equívoco histórico. são intensos, memoráveis e até mesmo hilariantes, tão presentes no cotidiano de cidades populosas. paradoxalmente, quando se procura saber a respeito do estado dos engarrafamentos locais, fala-se em informações sobre o TRÂNSITO.

    // publicado originalmente no vocabulário político para processos estéticos em 2014.