• tudo aquilo que fomos,
    ainda somos,

  • in

    insenin

    inse

    insluar

    insular

    insu

    eluc.

  • minúcias

    mistérios curados a pinça, com cuidados mil, despedaçados em lágrimas contra a parede em um balneário distante. gostaria de te beijar, gostaria de te contar estórias sobre pessoas felizes que deram certo, sobre brincadeiras: sonhos de adulto. ambas parecemos crianças, e a busca das coisas que se quer mas não se sabe ao certo.

    viver a vida com uma intensidade dosada, de criações para os futuros incertos e corações sortidos tirados em um pacote de balas. sai-se pela noite costurando buracos dos outros, bebendo até transbordar, não cai no chão porque mamãe ensinou bons modos. entre os mundos quietinhos de cautelas cuidadosas e de desejos previsíveis e as ruas sujas, imundas e cheias de incertezas. tem aquelas bonitezas que se acha pelos lugares improváveis, pelos óbvios corações próximos demais pra se acreditar.

    hoje eu acordei várias vezes; ontem eu acordei de uma só e parecia ter dormido por milênios. entretanto, a náusea e a sensação de perda permaneceram inalteradas.

    tenho relutado até em escrever, concentro-me em viver e só cuspi a história uma única vez, não foi bonito, foi coisa de gente chapada, bêbada e velha desesperançada com a vida. da outra vez tentei contar, mas falei mais de passados que de presentes.

    como parênteses: o português mudou em várias regras, e eu não me conformo em escrever ideia sem acento. parece que falta algo, e é quase como em inglês. ideas for life. slogan de campanha de uma coisa qualquer – porque no fim as campanhas são todas quaisquer.

    medos de ideias nocivas contra mim. contra ti nunca quis fazer absolutamente nada de ruim, tornou-se potente agressão quando você disse, quando eu mais-que-verbalizei, domestiquei uma coisa intensa. pois é, minha querida, o mundo é assim ou é a forma como eu o vejo. e uma das coisas que eu busco, bem, é um certo tipo de compreensão.

    a dor se contorce aqui dentro, mas tem tanta cara de personagem indecisa que eu me esfacelo em solidão. fecharia-me nela, caso não tivesse que fazer coisas como trabalhar, estudar e viver. a vida no fim das contas é sempre essa soma de migalhas que vou catando pelo caminho, talvez enquanto não lançar o corpo todo aos riscos e às balas.

    tive tanta vontade de fazer uma dessas coisas que chamam de decadente, de gente perdida, tais como morar na rua ou virar stripper de boate no centro. mas as ruas são sujas demais e cheiram a derrota, e as noites têm gente feia e tosca em demasia. procurando coisas que não se pode nem pronunuciar, talvez caso as pessoas fossem todas belas e cheirosas (como em shortbus).

    meus medos viram estórias, os resultados de concursos estão como esperados, talvez aos vinte e quatro não se possa mais querer tantas coisas ao mesmo tempo. é hora de escolher entre a academia e as artes, negar a comunicação de vez ou tentar absorvê-la sem tantas adversidades. aversão eu tenho dos infelizes, mas é fato que tenho contado muitos passados e já começo a lamentar os futuros. porque as criações para a vida de crianças de 10 e 18 anos são diferentes daquelas dos quase adultos de vinte e quatro, mesmo com cara de 22, é uma criança que já precisa estar lá, em cima do palco, mostrando a que veio e mantendo a pose.

    minhas estórias por hora estão contorcidas, levemente enfermas e escondendo a pimenta por debaixo dos lençóis. caso de meninas bonitas, ideias para não sei quando: muitos desejos, como tem sido.

  • hortíferas

    as celebrações que relegas ao outono
    ao inverno
    às hortas vorazes criaturas antigas
    do condomínio
    do chão

    cultivo de meias-portas
    altivos, saltitantes
    embriagados envoltos em colagens
    turvas, imensidões
    povoamentos silvestres

    familiares mezaninos
    cabides, abraços
    aqueles meninos já grandes
    as suas voltas
    e botas, e cabelos encaracolados

    já não colhem tão sossegos como
    ouvi, uma vez, estive lá
    ficção
    viagem fantástica conto de pandemia
    brechas
    saudosas

    já não sei se
    há caminho
    se quero inventar
    buracos
    no chão
    que não há

    entretanto está
    aqui, diante de mim

    fundamento, ligadura:

     
    um espectro

  • (-)

    é preciso abandonar um universo para ir de encontro às coisas. poderia descrever minuciosamente alguns acasos, ou atravessar em vendavais os maus transeuntes. são públicas, as memórias. estão em desgaste corrente as multidões, que no entanto ganham força. sobrepõem-se continuamente. multidão-livro. multidão-blusa. multidão-multidão e categoria nenhuma. tentativas de apreensão rotineiras são contrapostas a evidências históricas, nenhuma animadora no presente momento. as versões que se estabelecem ululam, reinvindicam o poder para si, e esfacelam craquelê na esquina mais próxima. é invisível, o poder protocolado é invisível a si próprio, nariz entupido em sangue. existem rastros e razões diversas, controversas, justapostas, em guerra. é tão cansativa a guerra que meus neurônios pedem ar – um ventinho leve de vez em quando, para proliferar vulcões na costa alheia a nossa, ainda que vá. sempre irá. a energia está fervente, é difícil resistir, ela vem abrupta e toma conta de tudo. o sol lá em cima quase sempre alto, quase sempre enorme, a lua enorme, a crosta terrestre enorme, e as conexões wifi segurando tudo em uns cabozinhos, parecendo inocentes. nunca o foram – tamanha ilusão. construída a coletividades tão vastas, atingindo os cantos mais fundos, tudo mediado. tudo em público. são públicas as memórias do povo. somos públicos mictórios. construímos em bases que bebem em papel marcado, obsolescência de mercados, viagens além-mar. ecoam em si próprias sobrevalentes, insurrentes, novas velhas vozes que nunca ouvimos porque mediados, agora juntos. juntos, mediados e em público. que vozes. que campos permeiam esses caminhos, coletividades vozes, continente.

  • 2022 (profanado)

    marte entrou em gêmeos
    no dia do meu aniversário

    minha lua, meio do céu, kiron
    teu ascendente

    agora mercúrio, almuten figuris
    no meu mapa,

    retrograda
    do teu mercúrio ao meu

    que dirão estas vozes
    ou este silêncio

    da libra ao virgo
    da beleza à especificidade

    da balança ao detalhe

    irritado, diz alice
    eu reconheço

    há certo gozo do intelecto
    convite para uma fala dançante

    gorjeio gracioso
    verborrágico

    e quando isso acontece
    é bom sinal

    instiga, reverbera

    a vênus, aliás
    também virgo

    é porque as vênus e es mercúrios

    andam juntes
    nos nossos mapas

    em diferentes casas

    e ainda mercúrio
    volta a ficar direto

    no dia do teu
    aniversário

    mesmo dia das eleições
    aquele dia

    que é lembrado
    desde o reveillon

    vibrando
    uma virada

    que nos faça pulsar
    vida

    e já sei, sabemos
    como tantos indícios trazem

    uma conciliação
    algo de novo

    não sei se de libra
    ou de marte

    se urano
    ou a lua

    acho que sim,
    sagitário

    como estava
    no dia de sem palavras

    quando cedo vitória disse,
    no teatro,

    algo sobre o amor
    bem bonito, perco os detalhes

    mas lembro
    e falo

    do dedo no cu
    as pernas abertas

    a bota

    tomar no cu
    você precisa

    eu disse em verbo profanado

    é real
    sentir na pele

    deixar entrar

    ;

    naquele dia
    da entrada de marte em gêmeos

    respirei do estômago revolto,
    de novo,

    meu dia, reencontro
    sabe lá o que seria

    um show, uma névoa
    uma cortina estilhaçada

    um campo aberto de ideias
    disse tudo ali

    precisava

    como pôr o corpo em riste
    de novo

    inventar outra maneira de
    estar perto

    sem esforço
    sem desalento

    reescrever o encontro

    somente estar inteiro

  • spam

    eles têm os olhos vermelhos cheios de pontos de interrogações; dormem à noite e de dia também, no sofá; são inabitados por tempo indeterminado; alimentam frustrações buscando através da superação destas tornar seus dias mais felizes; comunicam-se esporadicamente com entes externos, em meios sociais diversos povoados por demais formas de sub-existência; não brigam; guardam beijos para o além; olham estrelas e o eclipse lunar; bebem quando lhe oferecem e o que lhes for oferecido; freqüentemente são encontrados tentando ler algum livro obscuro que mora na sua cabeceira ou estante: às vezes o vencem, às vezes não; navegam por estações indeterminadas; sonham em voar; sonham com frases desconexas; sonham em mergulhar em estrelas; sorriem com os olhos; brincam de fotografia; brilham no escuro; querem dominar o mundo – tendo a liberdade de poder desaparecer de vez em quando.

  • a bailar (xilofones)

    caçadores de mentiras
    espalham-se como ratos, como pássaros
    ululantes em céus de verão
    e em invernos.

    o ano todo
    a expor suas criações inéditas
    fugidias e pretensamente
    despreocupadas.

    costuro idéias
    de cores celofanes, bem longe dali
    todos os dias
    todos os dias
    pra espantar as memórias
    inóspitas.

    lembrar de futuros distantes
    onde histórias
    são criadas para entreter furacões
    de infâncias perdidas
    gastas em preocupações
    tão corriqueiras.

    ideias de gênios passantes
    com cachorros a tiracolo
    animais pitorescos
    fantasiados de carnavais
    por vir!

    xilofones de montão
    pra entreter
    tanta gente.

    (!)

  • i

    atores mesmos são eles gestos. vozes que não se misturam, vazios intelectos, atos que vão seguindo pontos, dançando pontos, se perdem.

    escandalosa miragem permanece forte na rua. quer invadir atos, vontades, mas só atinge a coisa mesma, sem nexo. é raso. ricocheteia nos prédios, nas pessoas, não vaza em ninguém.

    conversa de bar que escorre e praticamente não existe. só imagens, sorrisos, rumos difusos e repetições. às vezes música, som alto vindo das vozes, subterrâneo de atividades sonoras, efeitos químicos. nada mais que urgência, não é importante.

    converso no lugar, me junto, perco o dito das coisas e enfim faz sentido! entre perambular pelos escambos, pelas brechas, acessos à cultura e à imagem por um pouquinho de escape. mundos pequenos que apresentam eixos universos.

    do verbo que ainda não existe, acontece.

    situação simples que inverte, alimento, torna energia o fluxo. rodopia, cumpre, faz girar.

    quase sem nada, meio sem nada, por isso lá.