conheceu sem ser menina, visualizou sem ser mãe. conquistou aos poucos sem se tocar, perdeu aos poucos viajando em emoções.
depois que o moço voltou da europa tinha mudado as suas impressões, as suas idéias antes tão condensadas deste mundo em ficção; ficava nu nas festinhas freqüentemente por pura exibição, libertinagem, diversão. o mundo fictício ficava aqui mesmo, centrado entre o mar e a lagoa, a alta burguesia e as práticas mundanas. nossa passagem nele consistia em somente devanear e confabular idéias confusas sobre afinal coisa nenhuma, pois nada efetivamente importava, os assuntos objetivos não eram de nossa condição.
tínhamos vinte e muito poucos anos para superar a crise dos dezoito e ainda antes do fim da faculdade, a pós-graduação, a vida à frente mas principalmente a que aos poucos ficava para trás. todos os sonhos e liberdades caminhando em urgência inevitável para algo mais que sonhar pelados e bêbados com dias sem amanhã, com sexo e cinema.
a música participava das nossas vidas também, sim: para uns mais que para outros, mas foi peça relevante em pequenas discussões babacas acerca de madonna ou blur, tradicional ou exótico, indie ou pop-rock. nada além, as bandas eram só dos meus ex-namorados. em ficção, eles, ainda mais.
a moça chegava na cidade assim meio sem ser convidada, meio ela, meio não.
encontrou o moço ali pelos trajes da vida, as tragédias do cotidiano, esbarrou na boate e foi logo beijando:
na verdade eu não sei como foi, mas sei que se esbarraram e deu no que deu.
ele, tantos poucos-anos-corridos depois veio perguntar o que eu fazia, se estava bem, o que aspirava. falou sem entusiasmo da vida profissional, fato corriqueiro, sem planos de voltar. parece afinal que a vida obriga à definição de um algo um local ali pelos vinte e muitos anos, e depois serão só gorduras a chegar e trilha-se algum caminho escolhido.
a arrogância e a liberdade teriam se esvaído, ou vistas em rumo de extinção. a partir de um certo momento deixaram de ser opção para ser regra: seus pêlos vão cair e a sua vida aos poucos vai se extingüir.
que tão pouco gosto tem a estagnação!
o caminho ser um só não é bonito, mas é belo ter um caminho. mais belos ainda, ainda que calmos e quase tristes, são os horizontes apaziguados, os egos contidos e trabalhados, uma certa paz em solidão: a arrogância burguesa vira vida real, os brasileiros se mostram mais brasileiros quando voltam de longe.
chega a ser bonito também esse gosto pela terra mais com caráter de raiz que outra coisa. afinal, já sabíamos, aqui não é a terra das oportunidades.
e eis o momento de ver quem mete o pé na lama, quem nada na superfície até sabe-se lá quando, quem gira e sobe sobe sobe.
“você não precisa dar certo na vida”, uma vez um hippie disse para acalmar a moça. então ela sorriu e chorou ao mesmo tempo, depois foi beber, fumar, nadar.