inês nin ~ ESPAÇO AVI
15 a 25.08.2016
Brasília/DF

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para uma residência, pede-se comumente portfolio de artista e/ou uma proposta de trabalho a ser desenvolvida

deste momento entretempos, em que me equilibro e nos equilibramos adentrando tantas catástrofes, maravilhas e cotidianos sortidos, a práxis nós inventamos, e sobre isso

tenho trabalhado o improviso,

imergindo em atividades que envolvem esse reagir rapidamente a uma interferência, a uma situação, investigando modos de sair dela ou contornar seus movimentos, dançar conforme os ventos

um estudo de ações que só acontecem no tempo/espaço real do agora, repentino mas também repleto de respiros e observâncias

corpo alerta; relaxado e alerta

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em curva, anotações e leituras, perambulações sonâmbulas por entre os espaços, gravações de gestos, posturas e meditações em vídeo, rascunhos, escritos, recortes

(quem sabe chame-se uma metodologia)

de abalos sísmicos e refúgios, me concentro muito no lugar interno como modo de reorganização. dentro de mim bosques, florestas, praias vazias, montanhas. arriscar o prumo –

uma bússola

no metrô: rodopia, louca (leio como transtornada pela velocidade)

no avião: ?

(testaremos uma bússola a bordo da aeronave)

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admiro voar, gosto de alturas e até pilotaria aviões. contudo, estou pouco habituada. meus modos de locomoção na vida, praticados com frequência, em geral se baseiam nos pés, na força propulsora do corpo. caminhadas, pedaladas, danças, pulos, corridas. sobre rodas, além dos pedais, muitas vezes ônibus, poucas vezes carro, raras vezes motocicleta. voo, sim, desde criança, quando me contam que na primeira vez, em vez de fitar as nuvens e olhar pela janela, eu preferia me concentrar em comer iogurte.

encontrar nuvens numa estrada, trilha ou escalando uma montanha: me instiga e embeleza os instintos.

subir

eis aqui um monte de textos escritos sobre isso, vontades, desejos, propulsões e movimentos na medida em que conseguimos alcançar

(alguns requerem anos de treino)

assim como fugas, levamos uma vida a contornar e descobrir saídas, modos de sublevar ou rachar os modos correntes

– movimentos muitas vezes abruptos, como fechar um apartamento em menos de uma semana –

que acabam por decorrer em meses um pouco embolados, malas que se dividem entre cidades, transições pouco previstas, mas eis que

de novo uma casa, mudança operada quase sem perceber, recebida com gratidão profunda e sim,

uma varanda! aqui temos céu e plantas!

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seguir viagem, depois de um respiro e umas tantas reviravoltas, ocorre como o suprassumo destilado de uma decisão,

revista e reverberada em solitudes, idas e vindas, intenções

(revista a intenção e ajustado o eixo que vem-e-vai para uma posição mais confortável)

a temperança acaba de me ocorrer como carta no tarô em forma de livro que jodorowsky delegou a minhas amigas, e que tenho usado como oráculo

o número de 9 dias que escolho para essa estada se refere ao que o momento oportuno (kairós) pode me oferecer no momento e o aceito de bom grado, buscando um equilíbrio entre os caminhos

é também o número do eremita, carta que me saiu logo antes nesta forma livro que consulto. provável que por um hábito que vem de leituras do i ching, oráculo de origem chinesa em que se usa moedas ou dados para se chegar a uma soma de traços (um hexagrama composto de dois trigramas) e então ler sobre ele em um livro, com recados que se deitam sobre linhas contínuas ou partidas

investigo oráculos e me instiga profundamente o fato de sentidos e significados tão profundos (e narrativos, em sua interpretação) serem acessados pelo método do acaso. creio, talvez só um meio de acessar uma sabedoria, conscientizando-nos que o que sentimos e pensamos também influi nos resultados, e ainda nos fatos.

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pisarei pela primeira vez na região centro-oeste do brasil na próxima manhã, dia 15 de agosto de 2016, menos de um ciclo lunar decorrido desde o último dia fora do tempo (25 de julho), em que se inicia uma nova onda encantada segundo o sincronário maya

a lua se encontra em fase crescente, para a qual aprendi um novo rito de prosperidade que envolve fogueiras (e podem ser feitas a cada lunação).

celebraremos os 32 invernos decorridos desde que abri a boca neste mundo no meio do percurso, à lua cheia

e por fim, à lua minguante, seguirei viagem de novo ao rio de janeiro antes de voltar para casa.

durante esses 9 ou 10 dias de residência (considerando-se que chego na manhã do dia 15 e parto na manhã do dia 25) penso em ter uns poucos prospectos (para além dos improvisos e trabalho cotidiano)

sabemos que

: encontrarei outra residente entre os dias 19 e 21 de agosto

: pretendemos ir a alto paraíso, quem sabe acampar

: tive ou acredito ter tido pouco contato com a vegetação típica da região do planalto central, apesar de o cerrado também ser identificado com o estado de são paulo, muito desmatado, onde vivo. e portanto pretendo observá-la, se possível mergulhar nela, como costumo fazer em florestas (há muitos modos para isso)

: o quintal é propício para fogueiras e também projeções 🙂

: trabalhamos com o vídeo (a ser revigorado ou re-desbravado em processos de edição em software livre), com a fotografia sobretudo analógica, com as danças, com o silêncio e a escuta, com uns poucos ruídos, com rabiscos e a famigerada escrita

: estarei em pesquisa de movimentos corporais no lugar

: terei que dar conta de um certo cotidiano no sentido mais prático de afazeres remunerados, e que deverá ser muito bem ordenado de modo a conviver com as práticas de alegria e criativas em geral (o que de algum modo todas são)

: a bússola principal será a temperança, com o respiro como seu aliado

: ocorre, portanto, algum exercício de cálculos, a ser combinado com o improviso (descoberturas e cessões)

: haverá um aniversário e uma exposição de yasmin no mesmo dia (todos os bons presságios)

: prevê-se ou seria interessante ou importante organizar uma abertura de processo com convidados no espaço. sugeri o dia 23, mas como os próprios processos ainda se fazem, e as datas se ajustam em certa medida interna, decidiremos quanto a isso conjuntamente;

: estou animada!

os estudos recentes apontam para quaisquer práticas ou referências que envolvam ESPIRAIS, dentre os quais têm sido vividas/observadas

– as espirais no corpo, enquanto torção em movimentos levíssimos e gentis na arte marcial kinomichi;

– estar dentro de uma espiral e se orientar nela, atravessando com maestria e entre muitas pessoas, como no treinamento de dança passing through (atravessar);

– espirais na natureza, como parte da observada geometria sagrada, que se repete em redemoinhos, tornados, na pia, na privada, nos oceanos, nas plantas quando brotam e em nós, bichos;

– sentidos figurados empregados na fala e na prosa, quando se fala em espirais e o que denotam.

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RESILIÊNCIA é outro termo-chave, que pontua fortemente a pesquisa ‘corpo, ambiente e resiliência’ que desenvolvo desde 2014-15, e vai de encontro com espirais (como formas de atravessar e lidar com, mas também de encontro consigo e versatilidade no lidar com as diferentes situações que nos deparamos)

é premente o estado climático em que se encontra o planeta, fato conhecido, e no nosso entorno observamos inversões climáticas, secas e outros problemas graves que decorrem de práticas predatórias com a terra e devastação de florestas

da região do planalto central, onde se encontra brasília, noticia-se as frequentes queimadas espontâneas devido à temperatura, o clima seco e as práticas anteriormente mencionadas (que se apresentam em diferentes medidas e desmedidas)

braslília também é local onde se centralizam os acessos à região amazônica, importantes discussões que envolvem índios de diferentes etnias, indigenistas, pesquisadores e articuladores ambientais de modo a lidar com esses problemas

encontrar esse lugar construído há poucas décadas e que foi, transversalmente, tornado capital do país, será importante para compreender localmente, com os pés e corpo presente e de maneira ou de outra e certamente muito particular, como operam as instâncias ali localizadas e também os corpos, considerando-se arquietura e questões de deslocamento

estar na cidade porém em meio rural (no córrego do urubu), acredito ser a melhor maneira de experimentar esse espaço compartimentado que são as cidades, que dirá as modernas, e que ainda comporta cachoeiras

de céu e cachoeiras avistamos danças (alegria)

e em danças, certamente significa qualquer atividade situada na região que se conecte com o corpo (exceto as academias, corporativas), nas quais se sobressaem as acrobacias e aquelas que misturam corpo e ambiente, ou são feitas ao ar livre

(avistei algo de acrobacias e bambus, não encontro agora)

(no mais, quanto mais arriscamos, melhor. é tempo de atravessar e também conter velocidades. por isso planos serão mínimos; somente apresento observações e orientações para o percurso)

(me calo, irei observar os melhores modos de andar)

com alegria,
e até jajá,
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inês.