curvas

conjurar sistemas em meio às turvas águas de verão. chuva de verão é tão bonito.

faz seis meses que habito a cidade dos carros. me vejo atravessando viadutos gigantescos a cada dia, pensando em como construir mini cisternas em apartamentos, admirando casinhas num bairro bem perto daqui, de um mirante que traça a rota da horta comunitária descendo escadas preenchidas por graffitis coloridos.

não é só cinza a cidade dos carros. o caso é que me parece que tudo aqui se intensificou, e há mais tempo: há poucas brechas, nesse trajeto tão corrido, para refletir sobre os porquês dos sistemas vigentes. e, agora que quase não há mais água (no céu tem de monte), começamos a pedalar e cuidar de construir outros meios com mais afinco, a espalhar essas cores por aí. umas que, de fato, já lutam por seus cantos e contaminações lúdicas não é de hoje.

um embate confuso é: como ocupar as ruas (com passos, pedestres, ciclistas, crianças, festas, encontros, pessoas, vidas) sem que usem tais ações como alicerces para gentrificar. daí vêm aburguesamentos urbanos, progresso, terríveis prédios e demolições. gentrificação se tornou a primeira palavra de nossos dicionários de resistência, por necessidade, já faz alguns anos. para evitar a todo custo. sem deixar de ocupar.

[apropriadas serão todas as palavras: atentar para equívocos e truques ligados a ocupar e revitalizar espaços. e afins. e outros.]

de intensidades e reflexões: por mais que em distintas proporções, há bastante de ambas. corrijo. talvez, não necessariamente relacionadas. talvez o grupo de pesquisa só ande de carro particular. talvez umas figuras maravilhosas, ciclistas e horticultores, passem décadas de suas vidas gastando praticamente toda sua energia (física e espiritual) numa hipersaturação de festas ininterruptas, imagens ininterruptas, discursos fragmentários num fluxo sem fim. talvez, a ideia de tecnologia ainda demore muito para ser vista sob ângulos diversos, questionada a todo tempo sob o ponto de vista da necessidade (dentro da máquina de criar necessidades; no seu centro conflituado, cidade).

vista do edifício copan, são paulo, 2014

é demanda pessoal a confluência com florestas nesse percurso tão confuso, tortuoso, cheio de bifurcações. coloco assim para evitar questões maiores (mais silêncio, menos intensidades sem fim, pode ser uma necessidade de momento e pessoa, ou algumas pessoas e alguns momentos, enfim).

fato é que florestas são importantes para um sistema maior e mais fundamental de sustento da vida, algo visualmente tão distante, não raro, num cenário acimentado e controlado como este em que pisamos. por isso acontecem desconexões. interesse por natureza mediado por drogas sintéticas. interesse pelo capital que se sobrepõe a todos os outros. e inúmeras variações. em algumas delas, é possível um respiro, um ponto de fuga de onde emergem frutíferas ações.

enquanto isso, a cidade se expande, se mantém engarrafada, contínua. penso em como usar melhor o tempo durante essa estada, etapa de uma construção maior que talvez apontasse justamente para agora. ir para o olho do furacão, absorver e conhecer uns tantos interstícios e meandros nada simples. desse solfejo, da amálgama construída, gerar um sustento, encontrar abrigo, levantar faíscas, organizar.

08012015