tamanho

– “como você se amplifica?”

– processo. lentidão, depois tamanho. como a carta em que diz (não diz) onde está a chave do tamanho (você descobre, no
porvir, ao passo do movimento)

– onde está – ?

– acaso o movimento te percorre, te dá voltas, te brinca de inventar duzentas formas, e enquanto isso, enquanto isso,
percebe, envolve, envolve o movimento, envolve a dança, envolve os morfemas, as pessoas, o que há de vir

o que amplifica é o mesmo que move? não sabemos, mas envolvemos uma pá de lembranças enquanto procuramos, e encontramos quando não pensamos, lapsos de segundos vitais e sem números, afásicos, sem modo de existir que seja legível, na terra onde as formas têm nome

e pés grandes, que é o modo como se locomovem: a engolir montanhas. e se montanhas me agem, fico enorme. as montanhas daqui são escusas, abismais construídas por entre as gazes, que cobrem meus olhos e então posso viajar por entre as nuvens

membranas, muitas e resignadas nos envolvem, ora em fúria de gessos e rasgos

não me dobro, invento um passo para além dos pés e no entanto pequenino, que pode dar conta de e inclusive existir
sem que se perceba o caminho que se desenha, e no entanto ele se faz

acaso dança, vem compor uma comunidade, de códigos inventados diferentes destes que por aí ouvi, vindos de um lugar onde não medem montanhas, elas nos engolem, as engolimos, e juntas convivemos, somos crianças e vozes vidas que muitos crescem, lá talvez soe como o mesmo que fazem, engolir, mas não se pode engolir montanhas sem antes ouvi-las, como se faz uma união, cheia de ritos, cheiros e bocados. são sensitivas, elas. só se pode engolir montanhas uma vez que a elas se une, numa celebração, com profundo afeto em ambos os lados. então inventa um modo de caber dentro delas, e que elas te caibam assim de repente, enormes, como são, mas bem mansas vêm devagarinho inventando rumos, te abrem as encostas para que escale, pé ante pé, mão subindo, deslizando, pois quando te recebem, ir para o alto é quase como cair

e então serás tu montanha, engolir montanhas como uma vez me contaram que saberia, quando chegasse o momento, sereno, cheio de névoa, como um dia de sol que se fecha e abre, dependendo da direção dos ventos e da tua vontade

 

 

 

(reunido para uma convocatória, agora reaberto)

montanha ~ 9+1 laboratório aberto

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estive presente com instalações, fotografias e ação (escritura da carta em nanquim + papel de arroz)

9+1 laboratório aberto aconteceu entre os dias 25 e 27 de junho de 2016 e foi um primeiro encontro expositivo no antigo apartamento de familiares da clara machado, na tijuca, rio de janeiro.

9+1 é aline besouro / amanda Rocha (ba) / ana hortides / anaïs karenin / bianca madruga / clara machado / inês nin / leticia tandeta tartarotti / pedro veneroso (mg) + pollyana quintella

eis a carta montanha, escorrendo pelas mãos:

n04

escrevi isso numa tarde, depois de ruminar por uns dias. procurar olhar para os acontecimentos com outros olhos. pensei muito nisso de enviesar o olhar, tentar observar sob outro canto, de outros lugares.

carinhosamente, buscando outros modos de encontrar, comunicar. um escrito longo. um fôlego, alguns. chove forte lá fora, de novo. quase tudo é água aqui. respirar.

corpo que se levanta, também. que observa.

seja o que vier, não segura, não

sejamos grandes

você é

 

n05

evocar todas as forças em uma. temos várias.

te sinto amor e abraços, corpo, espírito, trocas infinitas.

a despeito do quanto duraram nossos encontros, chamo todos infinitos. talvez porque houve plenitude, cotidiano, afeto.

amor grande estou, aqui dentro, agora observo. o mundo em volta e como nele me situo.

é verdade que a gente carrega tudo consigo, sim é claro, mas às vezes ao se deslocar variam também os ruídos, podem mesmo diminuir.

um dos maiores ruídos com o qual não sei lidar é internet. por isso tenho limitado os acessos.

aqui funciona, estava até melhor do que previa, mas ontem choveu e deve ter dado algo com a antena. logo volta, dizem. fato é que caiu um raio bem perto, eu vi, depois o estrondo foi tão gigante que tremeu a casa. estou no sótão, terceiro andar. uma caverninha quase escondida donde se vê as coisas do alto. teto baixo, inclinado. me sinto acolhida e me escondo.

tem muitos pinheiros em volta, me encho do cheiro que emanam e isso me faz feliz. ainda caminhei pouco, até agora, estou a me entender com os dentros e os modos de andar. pé machucado, em subjetivo, o corpo tentando se reentender na dança. que na verdade é inventar uma dança, posto que me encaro sempre em começos. um exercício gigante, e supremo, esse de memória. olhar para o caminho percorrido e tentar reentender o novelo, desatar os nós que forem possíveis de desatar, seguir adiante. tem muitos novelos embolados aqui, uns mais protuberantes que outros. uns brilham, têm diversas cores. em certa medida escolho com quais quero lidar.

um abraço em novelo, um abraço com zelo e afeto em nome de tudo o que passou.

n01

n02

tenho que reconhecer os meus medos partidos, as vontades de sair, toda a tormenta que saiu daqui e que depois que passa não lembro mais como nem quando, não com detalhes. estar no presente, em especial se esse pode ser mais alegre e de ânimo recomposto, me traz também uma espécie de esquecimento do que já foi. fazer esse exercício de retornar ao que já foi e como fomos, como agimos e tudo o que provocamos, qual foi o desenrolar das coisas até aqui, é difícil, mas importante para entender como fluir. uma vez que estou em relação, não é suficiente eu elaborar comigo quais são as minhas prioridades supremas e acreditar que o mundo simplesmente irá me abraçar de novo como se não houvesse outra vez. é bobo, mas é isso que tenho vivido. a cabeça anuviada em desespero, de tempos muito custosos, dolorosos, incomodamente insanos e sem espaço para existir um em si que se faz pleno antes de estar com os outros. e como isso é importante.

Inês Nin004

Inês Nin006

me lembro muito de escuta, que no primeiro e-mail que vc me enviou quando ficamos juntas você falava de escuta, que havia escuta, e eu lembro que não faz muito tempo me enamorei da palavra. estudava então escritos sobre som, ruído e escuta, nos quais a parte da percepção e do silêncio sempre se destacaram. eu já conhecia alguns deles havia muito tempo, mas ao organizar encontros em torno da escuta em 2014, junto a uma amiga, comecei a pesquisar todos os usos e flexões da palavra, e entendi que para a dança que me interessava era tão essencial escutar o corpo da/o outra/o. para estar no mundo é também necessário escuta. escutar a si mesmo, profundamente, é meditação. algo que tantas vezes não conseguimos, dado o ruído não só do mundo mas aquele que está na gente mesmo. encalacrado lá no fundo, mas também manifesto na superfície, latejante, e de verdade, se deixamos.

Inês Nin026

peço que você leia esse e-mail como uma carta, escrito fora da rede, fora dos tempos enlouquecidos de imediatez sem escuta. eu preciso de tempo para escutar, às vezes. a mim mesma. preciso desses esconderijos forjados, muito, e não raro acho difícil me dar a essas aberturas (ou fechamentos) estando junto, estando em relação, seja ela qual for. e estando no mundo, por isso fui morar só! mas não pretendo estar só, não é meu desejo não estar em relação, não fazer junto, mas o contrário. e quando falo em antes e depois, sobre existir só primeiro para depois existir junto, me lembro que esse é um movimento que acontece em ciclos, ciclos diários talvez, ciclos de minutos, ciclos mais longos às vezes. claro que o mundo nem sempre se transforma no ritmo em que nós nos transformamos, de modo que nunca sabemos que estado de coisas e de pessoas encontraremos ao enfim sair do esconderijo. e aí entra outro desafio, outra espécie de prontidão de corpo que se apresenta, que é estar em sintonia, em sincronia em tempos variantes.

daí, a dança.

Inês Nin019

penso em chute no ar. em pedra. colisão, sim. movimento desordenado. como antes de algo adquirir forma, ele corre sem rumo, arrisca, atira, colide. deixa sair o que há, que pode variar entre afeto e dor. é desordem. desordem que sai, não precisa sair junto, às vezes melhor elaborar só, mas tem coisa que só se vê e se lida se aparece, daí, quem sabe, junto. bicho informe, acho que aquilo de que vc mais tem medo. movimentos desordenados colisão.

é a sociedade que, polida, quer ver polidos todos os seus membros. um modo de manter a ordem, mas também de manter as pessoas distantes, com começos e fins bem delimitados entre elas, lugares.

Inês Nin020

eu gosto de fazer, procurar, estar junto. gosto de me dar ao caos do não saber e dançar junto, de me dar às proezas. estar junto sempre desafio, e não é estar junto qualquer pessoa, de qualquer jeito.

procurar um abismo onde deixar as coisas duras, vê-las colidir consigo mesmas, sumir. não dar atenção a elas.

te gosto, sinto um amor bonito nas coisas da gente junto. te acho tão bonita quando te vejo que das últimas vezes evitava olhar. porque estava ali toda a tormenta, todos sentimentos guardados, bonitos e feios, e uma vida que via você tocando, de modo ou de outro.

talvez um movimento entender e olhar isso de fato, num primeiro momento, pela alegria de toda essa troca em potência, e também pela conversa que se deu de fato em

Inês Nin010

n11

 

nuvem, visconde de mauá, janeiro de 2016